OSCAR 2018: Visages, Villages (Idem)

O filme resulta extremamente delicado e sensível, talvez o último filme da cineasta Agnès Varda. Um belo trabalho de uma grande realizadora

24/01/2018 13:44 Por Rubens Ewald Filho
OSCAR 2018: Visages, Villages (Idem)

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Visages, Villages (Idem, tradução literal do Francês, Rostos, Cidades)

França, 17.1h29min. Direção de Roteiro de JR e Agnès Varda. Com Jean-Paul Beaujan, Amaury Bossy, Yves Boulen, Jeanine Carpentier, Godard (arquivo), Varda.

O novo (último) filme de Varda? Pode ser, será uma pena porque é difícil encontrar uma cineasta tão sensível e criativa ainda mais numa idade tão avançada. A gente já sabe que ela é uma lenda viva do cinema moderno (e ganhou recentemente um Oscar especial por sua carreira) ainda que possa ser surpreendente vê-la como uma baixinha, que não tem nada de bonita. Mas que ainda é capaz de fazer filmes como este, que encanta no momento os norte-americanos. Tive a sorte de encontrar duas vezes Varda, primeiro quando começava carreira num Festival do Rio, onde ela estava muito tímida na piscina do Hotel junto com o marido diretor de cinema Jacques Demy (veja abaixo) que se tornaria sem qualquer dúvida o mais importante e talentoso realizador de filmes musicais na Europa! E foi ela que cuidou de sua obra, resgatando os trabalhos e restaurando os filmes, hoje ainda mais admirados. No Rio, eles foram simpáticos comigo e anos depois, no escritório casa dela, o encontro foi mais profundo, não é uma pessoa terna e no decorrer do filme pode-se perceber isso. Ela é a figura dominante e seu parceiro chamado de JR faz tudo para agradá-la (ele é o técnico que realiza as fotos, depois estica e amplia as imagens em preto e branco que cola em prédios antigos, encantando as pessoas simples do interior que de repente se veem transformadas em modelos. Mas fica muito claro que ele tem uma afeição muito forte por ela que também insiste em ir conhecer a avó centenária do rapaz!

É sempre Varda que domina o momento, tomando as decisões e fazendo as sugestões do que certa maneira é uma exposição de Museu ao ar Livre, em lugares decadentes e até destruídos do interior da França. E tudo que indica parece dar certo, porque o filme resulta extremamente delicado e sensível, inclusive na parte final quando ela vai visitar seu velho amigo diretor Jean-Luc Godard, a quem ela dirigiu muitos anos antes num curta-metragem com ele e sua então mulher Anna Karina (outra a quem tive oportunidade de entrevistas em dois momentos diferentes). Agora ela vai até a casa dele, que mais parece um refúgio. Mas ele não aparece e mesmo assim deixa um recado tocante (e não consegue esconder os olhos que lacrimejam!). Há outra citação quando Varda numa cadeira de rodas no museu do Louvre é levada às pressas por JR no que é uma homenagem ao filme de Godard e Karina, Uma Mulher é uma Mulher (61). Reluto em chamar o filme de mero documentário. Foi feito com o ritmo certo nos cortes, enquadramentos, na destreza e até poesia no registro de imagens. Um belo trabalho de uma grande realizadora.

 

Quem é Agnès Varda?

Varda, Agnès (1928- )

A diretora mais famosa do cinema francês. Precursora da Nouvelle Vague, deu um show de sensibilidade e técnica em seu Duas Faces da Felicidade, para depois ficar na obscuridade diante do marido Jacques Demy (1931-1990). Nascida em 30 de maio em Bruxelas, estudou em Paris, foi repórter e fotógrafa oficial do Teatro Nacional Popular. Alternando-se entre documentários e filmes de ficção, trabalhando em todas as bitolas (16 mm, 35 mm, Super-8, Video, Video Digital) conseguiu fazer uma carreira coerente e criativa. Deu a volta por cima, ganhando o Leão de Ouro em Veneza por Os Rejeitados. Quando o marido morreu de Aids, se dedicou à sua memória realizando uma série de fitas sobre sua vida e obra. Em 2000, fez sucesso no circuito de arte com um belo filme sobre coletores de lixo e frutas. Isso lhe abriu as portas para continuar rodando documentários poéticos, que no fundo sempre foi sua especialidade. Este ano ganhou o Oscar especial da Academia por sua carreira e veio a Mostra de São Paulo para receber um prêmio. Eu a conheci no seu modesto “stúdio” em Paris, onde conversou horas sobre cinema, o marido e família, não especialmente simpática (como já não são mesmo os franceses, já que ela nasceu em Bruxelas). Este novo filme ela fez em parceria com um certo JR, fotografo e muralista, de estilo exótico, que fez também Ellis (não a cantora, 15, mas a ilha), Women are Heroes, 10. Ficaram amigos e realizaram este filme inesperado. Passeando pelo interior do país. Ganhou dois prêmios em Cannes (globo de ouro), Cinema Eye, Haifa, Mill Valley, Toronto, Vancouver. Foi o primeiro filme dela em 9 anos. Mas quer fazer mais a ideia foi conseguir uma espécie de perua (câmera van), basicamente um lugar ideal para se tirar fotos e revelá-los. Mas Agnês escolheu pequenas vilas e não grandes cidades, empregados de fazendas, fábricas, chama as mulheres e faz uma visita ao túmulo do célebre fotógrafo Henri Cartier-Bresson e depois ao de Martine Francke. Depois fotografa as esposas dos operários ao lado de seus maridos. Naturalmente é uma viagem ao passado, e os bons tempos da Nouvelle Vague e Godard (como a cena do Louvre de Band à Part). O filme se torna mais tocante à medida que vai chegando ao fim e a diretora aceita olhar a morte de frente. É sem dúvida um momento triste mas poético e delicado da obra da grande realizadora.

Filmografia Dir.: 1954 – La Pointe Courte (Philippe Noiret, Silvia Monfort) 1957 – Ô Saisons, Ô Chateaux (CM. Doc). 1958 – Opera Mouffe (CM. Dorothée Blank, José Varela). Du Côté de la Côte (CM. Doc). 1961 – Cléo das 5 às 7 (Cleo de 5 à 7. Corinne Marchand, Michel Legrand). 1963 – Salut les Cubains (CM. Doc). 1963 – As Duas Faces da Felicidade (Le Bonheur. Jean-Claude Drouot, Marie-France Boyer). 1964 – Les Enfants du Musée (CM. Doc). 1965 – Elsa La Rose (CM. Doc). 1965 – As Criaturas (Les Créatures. Catherine Deneuve, Michel Piccoli). 1967 – Loin du Vietnam (Co-d. Resnais, Klein, Godard, Lelouch, Ivens). Uncle Janco (CM. Doc). 1968 – Black Panthers (CM. Doc). 1969 – Lions Love (Shirley Clarke, Viva). 1970 – Nausicaa (France Dougnac, Myriam Boyer). 1975 – Daguerréotypes (Doc.). Réponse des Femmes (CM. Doc. 8mm). 1976 – Plaisir Dámoujr en Iran (CM. Valerie Mairesse, Ali Raffi). Duas Mulheres, Dois Destinos (L’Une Chant, l’Autre pas. Valerie Mairesse, Therese Liotard). 1977 – Quelques Femmes Bulles (MM. Video). 1980 – Mur, Murs (Doc. Juliet Berto) 1981 – Documenteur (Sabine Mamou, Mathieu Demy). 1982 – Ulysse (Doc. CM). Une Minute pour une Imagem (Série de 170 capítulos de dois minutos). 1984 – Les Dites Cariatides (CM. Doc.). 7 P., cuis., s. de b., ... à saisir (CM). 1985 – Os Rejeitados (Sans Toit Ni Loi. Sandrine Bonnaire, Macha Méril). 1986 – T´as de Beaux Escaliers... tu Sais (CM. Doc). 1987 – Kung-Fu Master (Jane Birkin, Charlotte Gainsbourg). Jane B. pour Agnès V. (Doc. Jean-Pierre Léaud, Jane Birkin). 1990 – Jacquot de Nantes (Philippe Maron, Édouard Joubeaud). 1992 – Les Demoiselles ont eu 25 ans (Doc. Catherine Deneuve, Jacques Perrin). 1993 – L´Univers de Jacques Demy (Doc.). 1995 – As Cento e uma Noites (Les 100 et 1 Nuits. Michel Piccolli, Marcello Mastroianni). 2000 – Les Glaneurs et la Glaneuse (Varda. Doc). 2003 – Le Lion Volatil (CM). 2004 – Ydessa, les ours et etc. (Doc. CM). Cinévardaphoto (Doc). Der Viennale '04-Trailer (CM). 2005 – Cléo de 5 à 7: Souvenirs et Anecdotes (CM). 2006 – Quelques veuves de Noirmoutier (Doc). 2008- As Praias de Agnès/ Les Plages de Agnès (Doc). 2011- Agnés de ci de là Varda (5 epis. Serie de teve).2015- Les 3 Boutons (CM).

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Sobre o Colunista:

Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho é jornalista formado pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), além de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados críticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veículos comunicação do país, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de São Paulo, além de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a década de 1980). Seus guias impressos anuais são tidos como a melhor referência em língua portuguesa sobre a sétima arte. Rubens já assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e é sempre requisitado para falar dos indicados na época da premiação do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fãs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleção particular dos filmes em que ela participou. Fez participações em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minisséries, incluindo as duas adaptações de “Éramos Seis” de Maria José Dupré. Ainda criança, começou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, além do título, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informações. Rubens considera seu trabalho mais importante o “Dicionário de Cineastas”, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o único de seu gênero no Brasil.

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