O Sexo Que Arrebata em Henry Miller

Sexus, um dos grandes romances de seu seculo

14/10/2023 02:08 Por Eron Duarte Fagundes
O Sexo Que Arrebata em Henry Miller

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O romancista norte-americano Henry Miller talvez seja o único prosador do mundo que construiu frases em prosa cujo sentido é gêmeo daquilo que disse o poeta francês Arthur Rimbaud. Miller escreveu sempre como se fosse jovem: como Rimbaud, que compôs toda sua animalidade poética antes dos vinte anos. Miller envelheceu como homem, mas sua literatura permaneceu viril e potente como se ele tivesse eternos vinte anos.

Sexus (1949) é o primeiro romance de sua A crucificação rosada e acompanha com despudor as aventuras humanas e sexuais do autor na Nova Iorque da década de 20. Ninguém escreveu exclusivamente sobre si mesmo com tanta energia e transcendência. Miller metaforiza sua existência com uma criatividade estonteante.

Sexus é um dos grandes romances de seu século, mas curiosamente faz tudo aquilo que a etiqueta de um bom romance manda não fazer. Miller fala o tempo todo de si mesmo, especialmente de suas fodas, que ele descreve minuciosamente; porém ele não é nenhum irritante ou irritadiço Charles Bukowski, Miller é um poeta da carne, herdeiro de Rimbaud. Miller seguidamente trai a ação dramática desviando-se para considerações metafísicas que perturbam o clima narrativo, Miller é um conversador filosófico exaustivo e mesmo na era do romance filosófico (Thomas Mann ou Umberto Eco) este caminho deve ser trilhado com cuidado, pois é perigosamente anti-romanesco. Miller fere todas as regras e mantém a unidade de sua obra-prima.

Henry Miller, este sábio da palavra, traz genialidades como esta:

“Dezesseis anos mais tarde, numa manhã de domingo, acompanhado por uma nativa da Argentina e uma puta francesa de Montmartre, caminho calmamente por uma catedral em Nápoles. Sinto-me como se finalmente tivesse encontrado o templo no qual gostaria de rezar. Não pertence nem a Deus nem ao papa, mas ao povo italiano. É um lugar imenso, lembra um celeiro, decorado com muito mau gosto e todos os adornos tão caros ao coração católico. Tem muito espaço vazio ou, melhor dizendo, muita extensão vazia de piso. As pessoas acorrem por todos os vários portões e andam por toda parte com a mais completa liberdade. A impressão é que estão de férias. Crianças cabriolam como cordeiros, algumas trazendo nas mãos pequenos ramalhetes de flores. As pessoas se dirigem umas às outras e trocam cumprimentos, como se estivessem andando pela rua. Ao longo das paredes podem-se ver imagens de mártires em várias posturas; recendem a sofrimento. Sinto um forte desejo de passar a mão pelo mármore frio, como para exortá-los a não sofrer tanto assim, chega a ser indecente. Quando me aproximo de uma das estátuas, percebo com o canto do olho uma mulher toda de preto que se ajoelha diante de um objeto sacro. Ela é a imagem da devoção. Mas não tenho como deixar de perceber que também é possuidora de uma bunda esplêndida, uma bunda musical, diria eu. (A bunda nos diz tudo sobre a mulher, seu caráter, seu temperamento, se é sanguínea, mórbida, alegre ou volúvel, capaz ou não de corresponder, se é leal ou mentirosa por natureza.)”

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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