O Romance do Amor dos Livros

Em O menino que comeu uma biblioteca (2018) Leticia Wierchowski faz uma comovente homenagem ao amor dos livros

21/01/2022 21:21 Por Eron Duarte Fagundes
O Romance do Amor dos Livros

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A gaúcha Leticia Wierchowski é um dos mais prestigiados escritores brasileiros. Em O menino que comeu uma biblioteca (2018) ela faz uma comovente homenagem ao amor dos livros: é a profissão de fé duma ficcionista em sua própria arte. A narradora central da história de Leticia é Eva; embora faça algumas referências a seu próprio universo, o foco da visão do texto que emana de Eva é um garoto que vive na Polônia dos anos da guerra, este menino adora livros, literatura mesmo, está disposto a comer uma biblioteca com seu cérebro literário, o nome dele é Jósik Tatar, no começo do livro ele está na companhia de gente como Conrad, Shakespeare, Kafka, Tolstoi, Oscar Wilde, e ao longo dos episódios muitos e variados escritores virão.

Leticia, hábil construtora de ações romanescas, exercita neste romance suas origens polonesas nascidas da memória de conversas com seus ascendentes na infância e ao mesmo tempo sua inevitável paixão pela literatura. “Tantos livros e tamanho amor pela palavra causavam certo estranhamento aos simplórios habitantes da pequena Terebin.” A narradora vai conciliando com bastante veracidade e sensibilidade ficcional os trechos habituais das vidas das personagens com as evocações literárias; as coisas não são descontínuas e a literatura nunca vem tornar pedante a vida. “Jósik estava em casa, sentado na sala, perdido no canto XXI da Ilíada, de Homero.”

Eva observa Jósik e conta a história. Lá pelas tantas Jósik chega a assumir sua própria história. Mas é para logo devolver a narração a Eva. As vozes se permutam. Eva e Jósik um pouco se espelham. Os tempos: também. “E, assim, vagaram por estradas, florestas e campos por semanas e semanas. A vida ao ar livre tinha lá os seus encantos, principalmente no verão. Certa vez, viram uma tropa de alemães na estrada. Fugiram para o mato e esconderam-se por muitas horas. Os alemães não gostavam de andarilhos nem de ciganos, e não era conveniente cruzar com eles por aí.”

Os cruzamentos de vozes de Eva e Jósik é um dos mundos de efabulação de Leticia. Na nota final, a autora confessa: “Há um escaninho na minha ficção onde eu guardo as histórias de temática polonesa.” E anota em conclusão: “Terebin, pequeno oco de mundo ainda repleto de personagens e de histórias por nascer.” Como a Palomas do romancista fronteiriço Juremir Machado da Silva, a Terebin de Leticia promete ser um ventre gerador de novas histórias.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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