Especial Sam Peckinpah - PARTE 2
Continuação da filmografia comentada do Diretor.


A Morte Não Manda Recado (The Ballad of Cable Hogue). EUA, 1970. 121 min. Diretor: Sam Peckinpah. Elenco: Jason Robard, Stella Stevens, David Warner, Strother Martin, Slim Pickens, L. Q. Jones, Peter Whitney, R. G. Armstrong.
Sinopse: Após ser abandonado por dois amigos no deserto, vagabundo descobre água na rota entre duas cidades e fica rico explorando-a. Mas só pensa na vingança.
Comentários: Este era o filme predileto do diretor Sam Peckinpah (1926-84), em detrimento dos badalados Meu Ódio Será Sua Herança ou Sob o Domínio do Medo e para muitos uma de suas obras-primas. Curiosamente, recorrendo muito pouco à violência extrema, por vezes em câmera lenta, que o consagrou. Multifacetado e difícil de definir, basicamente é uma paródia das sagas do desbravamento da América, com Jason Robards (1922-2000) fazendo o anti-herói Cable Hogue, vagabundo, sujo e analfabeto, que por total acaso fica rico ao descobrir água em uma região desértica entre duas cidades. E que tem como amigos um pastor de araque que só pensa em sexo (David Warner) e uma prostituta (Stella Stevens).
Peckinpah brinca com os ícones do western, gênero que amava, de uma forma que só a intimidade permite, inclusive com um final irônico e humano que mexe com a tradição de "vingança que redime" do gênero. Basicamente cômico, até com alguns rápidos momentos de pastelão, demora a cativar o espectador e não é para todos os públicos, em sua indefinição de estilo e na sutileza de seu humor. No lançamento foi um grande fracasso, provavelmente porque o público esperava morbidamente outro banho de sangue.
Sob o Domínio do Medo (Straw Dogs). EUA. 1971. 118 min. Diretor: Sam Peckinpah Elenco: Dustin Hoffman, Susan George, David Warner, Peter Vaughn, T.P. McKenna, Del Henney, Jim Norton, Donald Webster, Ken Hutchison, Peter Arne, Colin Welland.
Sinopse: Um matemático americano vai para o interior da Inglaterra com sua mulher que era da região, pensando em escrever um livro. Mas eles são atacados por rapazes da região, inclusive um ex-namorado dela. Depois de a estuprarem, ele é forçado a se defender. Com brutalidade.
Comentários: O que primeiro me chamou a atenção foi o fato de terem feito uma refilmagem, que por sinal foi enorme fracasso nos Estados Unidos. No Brasil, deve ser chamar Sob o Domínio do Mal (roubando o titulo de outros filmes, mais notadamente o clássico thriller de Frankenheimer, The Manchurian Candidate com Sinatra). É estrelado por James Marsden, Kate Boswsorth e Alexander Skasgaard, foi realizado por Rod Lurie (de A Ultima Fortaleza, a série de TV Commander in Chief) e muda a situação básica. O herói agora é um roteirista de cinema e não vão mais para a Inglaterra mas para o Sul dos Estados Unidos. O filme fez parte de um pacote de produções realizadas pela rede de TV ABC que estava tentando investir em cinema (junto com Cabaret, que por sinal não existe nem em DVD entre nós). Distribuído aqui pela Fox, foi um enorme sucesso de bilheteria no Brasil por causa de suas cenas de estupro muito violentas para a época (e até hoje). Também se aproveitou da fama então no auge do diretor.
Este foi o mais famoso filme não faroeste do diretor Sam Peckinpah. Ele era alcoólatra e isso causava sempre muitos problemas nas filmagens (chegou a pegar pneumonia por causa dos excessos). Praticamente todos os filmes que realizou foram modificados na montagem e causa para disputas (aqui chegou a ser despedido no meio da produção). Peckinpah foi apelidado de “o poeta da violência” pelos verdadeiros banhos de sangue estilizados, sempre presentes em seus filmes (e normalmente mostrados através de outra de suas marcas registradas, a câmera lenta).
Este Sob o Domínio do Medo é um dos mais violentos e com moral muito dúbia sobre o assunto, não ficando claro se é um elogio ao uso da violência como forma de defesa por parte do homem comum (isto é, uma espécie de faroeste moderno, onde o herói tem que tomar a lei em suas mãos, virar vigilante como a única forma de se defender e realmente ser um Homem macho digno do nome. Coisa que na época estava na moda nos filmes de Dirty Harry de Clint Eastwood ou Charles Bronson, com Desejo de Matar). Ou poderia ser visto como um alerta sobre a capacidade que a violência tem de contaminar até o mais pacato sujeito. Mas ainda que não se concorde com nenhuma das possibilidades, era difícil não admirar o virtuosismo de Peckinpah na encenação, ao mesmo tempo repugnante e fascinante. Claro que mesmo hoje as sequências podem ser ainda insuportáveis para muita gente, em especial o estupro que insinua também uma cena de sodomia (que foi planejada por Peckinpah de modo ainda mais violento e ultrajante, de tal forma que a atriz Susan George se recusou a fazê-lo daquela forma). Mas é melhor explicar melhor a história porque as pessoas tem preguiça de ler sinopse.
Dustin Hoffman magrinho, pequeno e sempre de óculos (o cartaz é o fetiche do filme, que é o óculos quebrado o que não impede sua ação). É curioso que ele não esconde até hoje que odiava o filme e não gostava de sua interpretação, afirma que só fez o filme pelo dinheiro (não sou grande admirador dele, que de vez em quando acerta em cheio mas com frequência também erra redondamente). Ele faz David, um matemático discreto e casado com uma garota inglesa Amy (Susan George, que andou na moda por uns tempos (Fuga Alucinada com Peter Fonda, Mandingo, mas largaria a carreira para cuidar de um haras de cavalos árabes em Northamptonshire com seu marido também ator Simon MacCorkindale. Ele morreu em 2010). Ele ganhou uma Bolsa de estudos e se refugiou numa casa velha alugada na terra natal da moça (locações em Lamoma Cove, St Buriyan , Tor Morvah, todas na Cornuália). O problema é que eles encontram também os desocupados locais, inclusive um ex namorado dela Norman (Ken Hutchinson, que aparece como sendo “apresentado”, ou seja é estreante. Depois fez mais TV mas também alguns filmes como Gandhi, Feitiço de Áquila, Masada). Eles todos bebem demasiado, brigando no Pub, desafiando as autoridades e ressentidos por não terem maiores empregos ou futuro. Começam prestando pequenos serviços na casa alugada mas são lentos, preguiçosos e arruaceiros. Pior que isso, se tornam violentos e passam abertamente a desafiar o estrangeiro que agora é dono de uma mulher que foi deles (para complicar um pouco há também a figura do bobo da aldeia, um sujeito suspeito e ao que parece realmente é um pedófilo, interpretado por David Warner, que não esta creditado por questões de seguro. É curioso que o fato de David Warner mancar quanto o de T.P. McKenna - que é o homem da lei do lugar - estar com o braço na tipoia, não constavam do roteiro e se devem a acidentes que os atores tiveram antes das filmagens).
De qualquer forma, David entra numa medição de forças com os arruaceiros e quando resolve proteger o doente, a situação foge do controle. Os três rapazes e mais um deles mais velho (Peter Vaughn, em papel recusado por Anthony Hopkins, Peter O´Toole e Richard Harris) cercam a casa do casal que fica sitiado (mais ou menos também como se fosse num faroeste) e tem que se defender como podem. Antes disso, quando David foi levado numa caçada, como falso pretexto, Amy foi abusada não apenas pelo ex-namorado, mas também por um dos outros rapazes (o namorado não queria deixar mas teve que concordar sob a mira de espingarda). Embora a cena seja toda filmada praticamente só no rosto da atriz, e com roupa (exceção dos seios) e não se compara a estupidez de Irreversível (02), a quem certamente influenciou. Mesmo assim é forte principalmente porque em determinado momento a moça passa a corresponder (mas se assusta e luta contra quando percebe que esta sendo sodomizada por um estranho). Portanto, só pela descrição dá para perceber que é uma sequencia bastante forte e é por causa dela que o filme circulou nos EUA em copia cortada. Então esta aqui que se apresenta como não tendo censura é apenas a mesma versão que passou em nossos cinemas (na nossa TV passou com alguma redução mas menos que lá fora).
Acho que o que realmente choca é o fato de Amy num certo momento ceder, o que lhe dará culpa e conflitos, se virando contra o marido dizendo que ele é covarde e fraco. Aliás eu achei a moça infantil, pouco inteligente e não da impressão de amar o marido, de estar mais é se aproveitando dele (dificultando inclusive o trabalho dele para o qual precisa de solidão e num momento, mudando uma formula dele só pelo prazer de realizar um apronto). Enfim, o casal fica sitiado e vai se defendendo como pode, com armas improvisadas, enfrentando um a um com crescente brutalidade (não tão explicita quanto as de hoje em dia). Ou seja, o filme não foge da catarse, o que só aumenta a duvida: será que David fez a coisa certa, você numa situação semelhante faria o mesmo? (logicamente houve muitas imitações).
Importante: repare que por nenhuma razão aparente, o filme começa do alto para baixo, ou seja, como se alguém estivesse observando os fatos de um lugar privilegiado, mesmo dos céus. Isso deve ter sido para justificar o titulo original que durante a história não é desvendado: o título original “Cães de Palha” (Straw Dogs) vem de uma citação, não no filme, mas de um filósofo chinês Lao-Tzu (“Céu e Terra não são humanos, e olham as pessoas como se fossem cães de palha”).
Antes de Hoffman, Jack Nicholson, Donald Sutherland e Sidney Poitier consideraram fazer o papel central. Diana Rigg, Charlotte Rampling e Helen Mirren foram cogitadas para a personagem que ficou com Susan. Muito violento, o filme hoje em dia provavelmente não teria sido liberado ou realizado (melhor dizendo, sem ter visto a refilmagem, aposto que aumentaram a violência e diminuíram o sexo, como os americanos costumam fazer habitualmente). Dustin é um pouco patético falando entre dentes e procurando parecer mais jovem. Mas Susan tem uma presença convincente (fiquei impressionado com o fato dela ter os dentes imperfeitos, coisa rara no cinema americano). A história custa bastante a desenvolver, até sua parte final. Foi indicado apenas ao Oscar® de Trilha Musical (de Jerry Fielding, 1922-80, o mesmo de Wild Bunch e Junnior Bonner). O filme ficou proibido para vídeo até 2002 na Inglaterra. É curioso que a coleção americana Criterion fez algo fora do comum, lançou o filme em edição especial em 2003, já em HD, mas com direitos a explorá-la por apenas um ano! Logo depois ficou fora de circulação. Um ultimo detalhe: Colin Welland, que faz o Reverendo Barney, foi depois o autor do roteiro original de Carruagens de Fogo.
Dez Segundos de Perigo (Junior Bonner). EUA, 72. Direção de Sam Peckinpah. Roteiro de Jeb Rosebrook. Com Steve McQueen, Robert Preston, Ida Lupino, Joe Don Baker, Ben Johnson, Mary Murphy, Barbara Leigh, William McKinney, Dub Taylor, Donald Barry.
Sinopse: o decadente peão de rodeios retorna para casa machucado em Prescott, Arizona para encontrar a família. A mãe sofredora, o pai mulherengo e o irmão que esta derrubando a casa. Resolve participar de uma nova competição ficando os 8 segundos necessários em cima do ouro exigidos pelo regulamento.
Comentários: Depois de alguns filmes notáveis seguidos, Sam decepcionou com este drama que se faz passar por aventura e não tem praticamente ação. Apenas um estudo de personagem, um peão de rodeio (McQueen entrando na sua fase esquisita!) que esta entrando em decadência. E o filme todo tem esse tom triste, pessimista, que não sabe aproveitar no elenco de dois veteranos famosos, Ida e Preston, como os pais dele. Acaba se tornando aborrecido e foi um fracasso. Talvez também porque os seguros não deixaram McQueen sequer se aproximar do touro perigoso (usaram um mansinho e isso fez tudo resultar falso).
Os Implacáveis (The Getaway). EUA, 1972. Diretor: Sam Peckinpah. Elenco: Steve McQueen, Ali MacGraw, Ben Johnson, Sally Struthers, Al Lettieri, Slim Pickens, Bo Hopkins.
Sinopse: Um casal de assaltantes de banco é traído e tem que fugir, perseguidos por um sócio psicopata que vai atrás deles até o México.
Comentários: Um roteiro do futuro diretor Walter Hill (48 Horas), baseado em livro de Jim Thompson, e depois refeito em 1994 com Kim Basinger e Alec Baldwin (como A Fuga, para marcar ainda mais a diferença ou semelhança, às vezes esta versão antiga leva o subtítulo de Fuga Perigosa). Famoso porque durante as filmagens a estrela Ali, que vinha do mega êxito de Love Story, iniciou romance com McQueen, mesmo ainda estando casada com Robert Evans, chefe de produção da Paramount. Ali e Steve ficariam juntos alguns anos, mas isso custaria caro à atriz, que perdeu seu estrelato. Bastante violenta como era o estilo do diretor Peckinpah, na época já com problemas de alcoolismo, ainda assim tem momentos fortes e interessantes, ou seja, é melhor que a refilmagem desnecessária. Marca também o começo do declínio de McQueen, naquele momento consumindo muitas drogas (na cena em que bate em Ali, acerta para valer, sem truques).
Pat Garrett & Billy The Kid (Pat Garrett and Billy The Kid) EUA, 73. Direção de Sam Peckinpah. Roteiro de Rudy Wurlitzer. Com James Coburn, Kris Kristofferson, Richard Jaeckel, Katy Jurado, Chill Wills, Barry Sullivan, Jason Robards, Bob Dylan, R.G. Armstrong, Luke Askew, John Beck.
Sinopse: O já velho Patt Garret é contratado como homem da lei para proteger um rico grupo de criadores de gado mexicanos. Mas tudo o que ele deseja é prender seu antigo amigo o jovem pistoleiro Billy The Kid (feito pelo cantor country Kris Kristofferson, no começo de uma bem sucedida carreira como ator. O personagem tem 21 anos e ele já estava com 36!).
Comentários: Este é outro dos filmes conturbados da carreira do diretor. Contam que ele estava no auge do alcoolismo e só ficava coerente quatro horas por dia, chegando no set já com garrafa de vodka, seguido de Grenadine. E já estava com delírio tremens. Isso para não falar das brigas e provocações (inclusive com Kris). Ainda assim o filme se atrasou porque mandaram câmera com defeito e descobriram só depois de semanas que ela tinha rodado tudo em fora de foco (e foi preciso refazer). Na filmagem Kris conheceu e se apaixonou pela cantora Rita Coolidge (se divorciaram em 80). A maior ousadia da direção foi chamar o então novato Bob Dylan para cantar na trilha e fazer papel de trovador. O filme acabou sendo remontado pela MGM para 100 minutos (a restaurada teria 116 minutos e não mudava grande coisa).
Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia (Bring me the Head of Alfredo Garcia). EUA, 1974. 112 min. Direção: Sam Peckinpah. Elenco: Warren Oates, Gig Young, Robert Webber, Isela Vega, Helmut Dantine, Emilio Fernandez, Kris Kristofferson.
Sinopse: Patriarca paga fortuna para quem trouxer a cabeça do homem que engravidou sua filha.
Comentários: Não foi o último filme do famoso diretor Sam Peckinpah, originalmente da MGM, ele ainda faria alguns outros. Mas não tão ruim. Ele já estava muito prejudicado pelo alcoolismo, embora ironicamente esse tenha sido o único de seus trabalhos que não foi remontado pelo estúdio. Mas o orçamento é visivelmente pequeno e o visual extremamente brega. A capa do filme em DVD diz que está em widescreen mas não parece, porque os enquadramentos são feios e parecem filme brasileiro da época. O ator Warren Oates (1928-82) procurou imitar o diretor inclusive usando óculos escuros parecidos. Na época foi considerado violento, mas passou pela censura da ditadura brasileira mas foi proibido em outros lugares como a Argentina. Tem várias cenas de nudez feminina, por vezes da estrela mexicana Vega, gratuitas.
Revisto hoje continua datado, muito feio, com cara de trash. Difícil dizer se Peckinpah procurou isso de propósito (já que é quase todo rodado no México e até no hotel mais famoso da época, o Camino Real). Fica trash também por causa da história, que começa numa fazenda mexicana quando o patriarca (o famoso diretor mexicano Emilio Fernandez), que descobre que a filha esta grávida de um certo sujeito que considerava como filho e agora pede que lhe tragam a cabeça de Alfredo Garcia. Os americanos Young e Webber são os agentes dele que oferecem a serviço a Oates, que descobre que este já morreu e resolver ir ao túmulo para retirar sua cabeça. A situação vai se complicando com uma sucessão de tiroteios e mortes. Sempre a beira do ridículo. Sem dúvida, o pior filme do diretor que era chamado de mestre da violência!
Elite de Assassinos ou Assassinos de Elite (The Killer Elite). EUA, 1975. 122 min. Direção: Sam Peckinpah. Elenco: James Caan, Robert Duvall, Gig Young, Burt Young, Bo Hopkins, Arthur Hill, Mako, Kate Heflin.
Sinopse: São dois agentes amigos que são mercenários que trabalham para uma agencia que presta serviços para a CIA. Mas George trai Mike deixando-o aleijado. Mas ele se recupera para voltar à ação e partir para a vingança.
Comentários: Originalmente da United Artists, este foi um filme de encomenda que o diretor Sam Peckinpah aceitou fazer sob as ordens do chefe do estúdio Mike Medavoy (e a única concessão que fez foi reduzir a violência das cenas de ação para conseguir censura mais leve). Peckinpah era o mestre da violência e das cenas em câmera lenta (e na vida pessoal com o alcoolismo que o tornou impossível de trabalhar) e se complica um pouco com a trama que é daquelas histórias cheias de ambiguidades do gênero. Mas Caan está bem e a vontade como o agente vitima de traição que volta à ativa para uma missão (proteger chineses), que por acaso também envolve o ex-amigo (Duvall, sempre superestimado). O filme tem uma cara (visual) dos anos 70, mas sabe aproveitar as locações em San Francisco, utilizando suas ruas e ladeiras, sua Chinatown, um cemitérios de navios de guerra (para o tiroteio final), várias cenas de luta que envolvem Karatê, Ninjitsu e espada. Às vezes ele perde bons momentos (como a piada do guarda que foge com a bomba). Foi o último filme do diretor com seu compositor Jerry Fielding (que pulou fora). Peckinpah voltaria a ação ainda em mais três outros filmes como diretor.
Cruz de Ferro (Cross of Iron) Inglaterra/ Alemanha/ Iugoslávia, 1977. 128 min. Diretor: Sam Peckinpah. Elenco: James Coburn, Maximilian Schell, James Mason, David Warner, Klaus Löwitsch, Vadim Glowna, Roger Fritz, Senta Berger.
Sinopse: Em 1943, na península de Taman, os alemães estão sendo dizimados ao invadirem a Rússia.
Comentários: Sam Peckinpah, chamado de “o mestre da violência”, fez este único filme de guerra. Que não é ruim, mas também não é nada especial. Talvez por já estar em decadência, dominado pelo alcoolismo. O filme é centrado no conflito entre o sargento Coburn e o capitão Schell, um que é soldado profissional líder natural, e o outro que é símbolo da elite prussiana, aristocrata que sonha em conseguir a condecoração Cruz de Ferro, mesmo que para isso tenha que fazer chantagem com um subalterno, acusando-o de homossexual. O conflito vai se agravando e tem final simbólico.
Os letreiros de abertura são sugestivos, com cenas de arquivos e canções de crianças. Há algumas sequências comoventes: o avanço do pelotão sobre a fuzilaria dos próprios colegas e a amizade do menino russo com o prisioneiro. Fotografado em tons escuros (a cópia é apenas razoável, esverdeada), com muita lama, tem uma sequência forte (a castração feita pelas mulheres russas). Tem defeitos – atores ingleses fazendo alemães, o fato de todos serem pouco nazistas, uma montagem irregular. Foi o último trabalho interessante do diretor e teve uma continuação, Ruptura das Linhas Inimigas (Breakthrough, 1979), com Richard Burton assumindo o papel do sargento Steiner.
Comboio (Convoy). EUA, 1978. 106 min. Diretor: Sam Peckinpah. Elenco: Kris Kristofferson, Ali MacGraw, Ernest Borgnine, Burt Young, Madge Sinclair, Fraklin Ajaye, Brian Davies, Seymour Cassel, Cassie Yates.
Sinopse: Após ser achacado por um policial corrupto, um caminhoneiro em fuga lidera comboio de protesto formado por dezenas de caminhões.
Comentários: A única razão porque este filme é famoso é porque marcou a volta ao cinema de Ali McGraw depois de um tempo afastada do cinema. Durante as filmagens de uma fita anterior, Os Implacáveis (72) do mesmo diretor, Ali (então famosa pelo sucesso de Love Story era casada com Robert Evans, chefe de produção da Paramount) se apaixonou pelo carismático e excêntrico McQueen (1930-80). Por causa dele, largou tudo, inclusive o estrelato, embarcando numa aventura que durou de 1973 a 78. Foi um desastre maior do que qualquer um que mostra esta fita menor, com que ela tentou retornar ao cinema pelas mãos do mesmo Peckinpah. Foi seu penúltimo trabalho já decadente e prejudicado pelo alcoolismo, mas ainda assim o filme tem sua marca: muita câmara lenta, violência e destruição tratadas com evidente simpatia, personagens em uma luta meio suicida contra o sistema (que era exatamente como ele mesmo levava sua vida!).
Kris faz um caminhoneiro apelidado Pato de Borracha, que tem um histórico de atritos e tolerância com um policial corrupto (Borgnine, ótimo). Quando o policial passa dos limites e tenta prender injustamente outro caminhoneiro, que está a caminho de casa para ver o nascimento do filho, o herói lidera um comboio de caminhões em fuga através de três estados, que vai agregando participantes e a simpatia popular, chamando por fim a atenção de políticos que querem se aproveitar o acontecimento. Tudo comunicado através de uma coisa superada hoje, o CB, uma espécie de rádio que era a novidade do filme.
Ali era uma atriz muito fraca com suas duas únicas expressões habituais, o obrigatório interesse romântico do herói, uma fotógrafa que ele conheceu por acaso na estrada. O filme cai no segundo ato, quando começam as armações dos políticos, e explora muito mal os personagens, todos estereotipados e unidimensionais. Mas o que realmente interessa é a longa perseguição, cheia de desastres e destruição, encenada espetacularmente por Peckinpah em uma sucessão de eventos até meio absurdos e irreais que culminam em um final igualmente bizarro, tudo de acordo com a peculiar mitologia do diretor.
O filme foi inspirado em uma canção country de sucesso de CW McCall. Peckinpah aparece no filme como o técnico de som de óculos escuros durante a entrevista que Pato de Borracha dá rodando na estrada.
O Casal Osterman (The Osterman Weekend). EUA, 1983. 103 min. Diretor: Sam Peckimpah. Elenco: Rutger Hauer, John Hurt, Craig T. Nelson, Dennis Hopper, Chris Sarandon, Meg Foster, Helen Shaver, Cassie Yates, Burt Lancaster.
Sinopse: Apresentador de programa investigativo de televisão é convencido por agentes da CIA que seus amigos mais próximos são espiões disfarçados. Ele aceita então que sua casa seja monitorada pelos agentes, durante uma reunião anual dos companheiros.
Comentários: Último filme do mago da violência Sam Peckimpah, já em decadência pela bebida (e depois do fraco Comboio, com Kris Kristofferson), que teve problemas com o corte final do filme e acabou sendo demitido pelos produtores, que remontaram algumas sequências. É baseada no romance de Robert Ludlum (o mesmo autor dos A Identidade Bourne e O Documento Holcroft) e se passa na paranoia da Guerra Fria, quando o personagem de Rutger Hauer é convencido por um impecável John Hurt a investigar seus amigos (Hopper, Nelson e Sarandon), suspeitos de serem espiões soviéticos. A narrativa é um pouco truncada, com alguns furos no roteiro, e não envelheceu muito bem, mas a mão firme do diretor ainda é presente (como algumas de suas trucagens características – como o uso genial de câmera lenta) e segura bem a trama, que tem boas cenas de ação. Não é de seus melhores trabalhos mais ainda é competente.
Especial Sam Peckinpah - PARTE 1


Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho é jornalista formado pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), além de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados críticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veículos comunicação do país, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de São Paulo, além de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a década de 1980). Seus guias impressos anuais são tidos como a melhor referência em língua portuguesa sobre a sétima arte. Rubens já assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e é sempre requisitado para falar dos indicados na época da premiação do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fãs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleção particular dos filmes em que ela participou. Fez participações em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minisséries, incluindo as duas adaptações de Éramos Seis de Maria José Dupré. Ainda criança, começou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, além do título, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informações. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionário de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o único de seu gênero no Brasil.

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