A Morte do Erotismo
Maria e Sylvia se foram... E agora?
No começo de 2011 morreu a atriz francesa Maria Schneider, cuja personagem era sodomizada pela criatura do ator americano Marlon Brando em O último tango em Paris (1972), obra–prima rodada pelo italiano Bernardo Bertolucci. Nesta primavera brasileira (outono europeu) outro símbolo dos périplos cinematográficos dos anos 70, a holandesa Sylvia Kristel, morre também “relativamente jovem”, aos sessenta anos de idade. Se Maria faleceu em Paris mesmo, no cenário que a marcou em celuloide, Sylvia deixou o mundo num hospital de Amsterdã, em sua Holanda natal. Sylvia protagonizou um filme desossado, Emmanuelle (1974), do francês Just Jaeckin, mas, apesar da falta de jeito narrativo, se tornou um volumoso sucesso, um dos atrativos turísticos de Paris, a cidade do Museu do Louvre, dos bares de Saint-Germain-des-Prés, de catedrais góticas e dos cabarés arcaicos de Montmartre. Quem hoje circular pelo Quartier Latin e pela avenida dos Champs Élysées e der com os cinemas por ali espalhados deve reverenciar estas duas damas de um erotismo (humano e cinematográfico) que já não existe.
Ao longo de suas vidas, Maria e Sylvia ficaram estigmatizadas, uma pelo tango vagabundo de Paris, outra pela sensualidade vulgar e meio suburbana à francesa. Ambas encararam as necessidades machistas do erotismo internacional como uma diluição de suas possibilidades de intérprete. Esforçaram-se por rejeitar o apodo de atrizes boas para cenas de sexo, abismo para o qual o desejo do público as empurrava. Tentaram muitas vezes papéis opostos àqueles que deram início à sua fama. Somente não se tornaram freiras, como requereria um certo moralismo interno. Ou fanáticas religiosas, como a brasileira Darlene Glória, por algum distúrbio neuronial qualquer. Mas no mundo daqueles anos, que seguiu em progressão geométrica nas décadas seguintes até hoje, nenhum indivíduo —ator ou não— foge à força da propaganda; é-se o que a propaganda diz que se é, ao menos externamente. E o universo cinematográfico vive muito destas aparências. Para ver além do que transparece (à primeira vista) é preciso ir para fora dos aspectos físicos do erotismo. Nestes aspectos físicos certamente o erotismo interpretado pela francesa Maria Schneider e pela holandesa Sylvia Kristel está morto. Como a própria memória da década de 70 do século XX. Este erotismo e esta memória sobrevivem no espírito, que transcende do físico. O mais está no filósofo francês Henri Bergson.
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro Uma vida nos cinemas, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br