A Energia Narrativa e as Facilidades de Richardson

Torna-se dificil ficar indiferente a energia narrativa dum filme como Ceu azul

03/02/2021 13:01 Por Eron Duarte Fagundes
A Energia Narrativa e as Facilidades de Richardson

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Torna-se difícil ficar indiferente à energia narrativa dum filme como Céu azul (Blue sky; 1991), realizado nos Estados Unidos pelo inglês Tony Richardson. Ainda que o espectador possa incomodar-se com as facilidades de encenação e visão das coisas que o cinema de Richardson parece ter estabelecido, com poucas variações, como um padrão estético. O cineasta concluiu este seu filme em 1991, pouco antes de falecer em face dos problemas de AIDS. Como a produtora do filme, a Orion Pictures, estava em processo de falência, a realização ficou engavetada até 1994, quando passou a conquistar seus espectadores, especialmente pelo extraordinário desenvolvimento cênico de sua intérprete central, Jessica Lange.

A energia narrativa a que me referi na abertura deste comentário nasce, em boa parte, da trepidação de imagem de Jessica dentro da cena. É certo que Richardson tem a habilidade para tornar, pelo quadro, pelo cenário, pela montagem, palpável esta inquietação de atriz de Jessica. Também é verdade que o parceiro de cena da atriz, o ator Tommy Lee Jones, está à altura, é um intérprete de grandes engenho e recursos. Mas Jessica é o furacão: faz ventar fortemente a imagem, e é por esse vento que somos carregados filme afora.

A ambientação da narrativa é uma base nuclear militar americana na década de 60. Isto apontaria o filme para questionamentos políticos; na verdade, estes questionamentos se apagam bastante diante da proposta de sensualidade cinematográfica de Richardson a partir do modelo de interpretação criado por Jessica. Nos anos 60 Richardson rodou Chamas de verão (1966) com Jeanne Moreau; igualmente o cineasta se valia do sensual duma estrela de cinema para dar cor a  seu recado; mas Jeanne fazia sua contenção francesa, provocava usando um pouco o lado cerebral da coisa, o instinto soltava-se é certo, mas o equilíbrio era de outro naipe; em Céu azul é bem um espetáculo à americana, criativo, exuberante, sim, mas algo do lado de cá do Atlântico; outro dado que  afasta o dois filmes é a visão austera e amoral de Chamas de verão e um certo disfarçado moralismo na visão duma mulher diferente e liberada à sua maneira em Céu azul. São dois belos filmes, carregados pelos engenhos de duas grandes intérpretes, sob as vistas dum cinema às vezes intenso mas irregular construído por Richardson.

Jessica, a atriz de O show deve continuar (1979), de Bob Fosse, Frances (1982), de Graeme Cliford, e Tootsie (1983), de Sydney Pollack, vive uma esposa de um militar (Tommy Lee Jones, excelente na construção sutil e medida de sua personagem), de comportamento instável, entre a infantilidade e a fácil sedução sexual para cima dos machos; Jessica entrega todos os recursos, variando os tons de sua personagem e exibindo sua grande capacidade de dançarina, criando no corpo do filme uma dimensão do épico duma figura de cinema como poucas vezes se teve a oportunidade de ver. De uma certa maneira, Richardson, utilizando com grande clarividência a forma de ser em imagem de Jessica Lange, discute em seu filme os paradoxos entre o amor e o sexo, e o grau de insanidade que isto pode trazer a certos indivíduos.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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