Ritmo Acelerado

O poder das informações é a força motora de 120 Batimentos Por Minuto, filme do marroquino Robin Campillo

29/01/2018 07:07 Por Bianca Zasso
Ritmo Acelerado

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Acesso à informação. Dizem por aí que vivemos tempos onde isso está ao alcance de todos. Mas será que sabemos o que deveríamos saber? Será que nos contam toda a “verdade”? É óbvio que não. Tudo e todos neste mundo possuem os seus segredos. Mas e quando o que se esconde pode mudar a vida de alguém? O poder das informações é a força motora de 120 Batimentos Por Minuto, filme do marroquino Robin Campillo. Depois de ter mostrado sensibilidade para registrar romances intensos em Eastern Boys, de 2013, o diretor e roteirista resolveu voltar seu olhar sincero e sua câmera para o grupo Act Up, que nos anos 90 movimentou o mundo com seus protestos que visavam chamar a atenção das autoridades para a situação dos portadores do vírus da Aids num tempo onde o assunto ainda era um tabu.

Aliás, uma das funções de 120 Batimentos Por Minutos é reforçar que, por mais que hoje haja menos preconceito, ainda é complicado fazer do assunto algo cotidiano que deve ser discutido sem floreios. Logo de entrada, o filme nos inunda de informações, e seguirá assim até quase encerrar seu primeiro ato. A câmera de Campillo coloca o espectador dentro das reuniões da Act Up francesa, optando por uma montagem lenta, num ritmo documental. Quem não ler a sinopse antes da sessão, pode até pensar que estamos diante de um registro, e não de uma ficção. Se a verborragia pode ser uma chatice para parte do público, logo percebemos que ela tem uma função mais social que cinematográfica. É preciso falar sobre Aids, e é preciso falar alto, e não aos sussurros. Parte do trabalho da entidade é dar visibilidade sobre a doença entre gays, lésbicas, usuários de drogas e prostitutas, que correm tantos riscos quanto os heterossexuais. Cada palestra e manifesto representado em 120 Batimentos Por Minuto está ali para nos informar e não apenas entreter. Talvez por medo de não conseguir abranger todas as informações desejadas, Campillo tenha feito um filmes longo e que poderíamos chamar de duplo.

Há um outro 120 Batimentos Por Minuto dentro de 120 Batimentos Por minuto. Ao lado do retrato do trabalho do Act Up, está a história de amor de Sean e Nathan. Um é soropositivo, o outro não. Ambos participam do grupo, mas possuem percepções distintas sobre a Aids. A união dos dois permite que o filme tenha sua camada mais poética exaltada, seja nos longos diálogos entre Sean e Nathan sobre suas experiências ou pelos vários planos da nuca de ambos. Estamos na cadeira localizada atrás daqueles dois homens que se amam, mas sabem que vivem empecilhos que vão além do preconceito. Medo, dor, solidão, fuga. A proximidade da morte muda a maneira de Sean encarar seus dias e Nathan, ao acompanhar este processo sem fraquejar, também se transforma. Se até ontem a Aids era uma ameaça invisível, agora é a culpada pelo estado crítico de saúde da pessoa que ele ama. Olhar de fora emociona, mas estar no campo de batalha é uma coisa completamente diferente.

Vencedor do Grande Prêmio do Júri do Festival de Cannes no ano em que Pedro Almodóvar o presidiu, 120 Batimentos Por Minuto tem duas joias em seu elenco que vão surgindo aos poucos na tela para, do meio para o final da trama, conquistarem nossa simpatia e garantir nossas lágrimas. E isto é um elogio, pois o choro não é o objetivo principal do filme. Existe alma em cada cena, em cada diálogo que transborda sinceridade, em cada toque discreto e cheio de significado que ganha um close. O argentino Nahuel Pérez Biscayart e o francês Arnaud Valois imprimem verdade em cada gesto e primam pela naturalidade. Mesmo repletos de informações que vão desde testes de vacinas até acesso à medicamentos, encontramos a tal magia do cinema, que faz com que nos envolvamos com vidas que acabamos de descobrir. A função social do filme e cumprida com muito mais talento do que aqueles documentários toscos que as escolas apresentavam no tempo em que esta que vos escreve frequentava os bancos escolares. Mas o que ajuda a fixar cada dado é a força do amor de Sean e Nathan, que vai além do prazer e dos carinhos entre uma reunião e outra. Está no afeto, aquele que acontece quando não estamos felizes e nossas forças não permitem que achemos graça nas pequenas coisas. Amar em dias ensolarados e sorridentes é fácil. Inspirador é garantir a força do abraço no meio da tempestade. Frio na barriga de primeiro encontro é bom. Mas você já experimentou sentir o coração acelerado durante a espera por uma notícia que envolve quem você ama? É o verdadeiro ritmo da vida. Dá um medo danado. Mas vale cada batida.

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Sobre o Colunista:

Bianca Zasso

Bianca Zasso

Bianca Zasso é jornalista e especialista em cinema formada pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Durante cinco anos foi figura ativa do projeto Cineclube Unifra. Com diversas publicações, participou da obra Uma história a cada filme (UFSM, vol. 4). Ama cinema desde que se entende por gente, mas foi a partir do final de 2008 que transformou essa paixão em tema de suas pesquisas. Na academia, seu foco é o cinema oriental, com ênfase na obra do cineasta Akira Kurosawa, e o cinema independente americano, analisando as questões fílmicas e antropológicas que envolveram a parceria entre o diretor John Cassavetes e sua esposa, a atriz Gena Rowlands. Como crítica de cinema seu trabalho se expande sobre boa parte da Sétima Arte.

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