Hrcules, o mais cinematogrfico dos heris da Mitologia
Conhea a trajetria deste heri nas telonas e telinhas atravs dos tempos
Muito antes que os super-heróis dos quadrinhos dominassem a produção cinematográfica, personagens de grande força e poder já chamavam a atenção do público. Antigas mitologias foram fontes inesgotáveis de heróis como Jasão, Maciste, Perseu e... o maior deles, o lendário Hércules! A vida do semideus grego Héracles (rebatizado pelos romanos como Hércules) começa quando Zeus (o senhor do Olimpo) desce a Terra e seduz a mortal Alcmena, esposa de Anfitrião. Dessa noite de amor nasce Hércules, de força sobre-humana somente superada pelo seu temperamento arredio, violento e pomposo, muito diferente do personagem retratado pelo cinema. O Leão do Olimpo, alcunha recebida depois de matar o Leão de Neméia, um de seus famosos doze trabalhos, sempre foi um mito reconstruído como forma de agradar os amantes dos épicos que se proliferaram na década de 50. Na época os produtores procuravam meios para competir com a televisão e investiram nos grandes espetáculos recriando impérios como a antiga Roma, abusando de imagens panorâmicas, grandes batalhas e feitos extraordinários. Enquanto Hollywood realizou Ben Hur, Os Dez Mandamentos e Quo Vadis, coube a Itália trazer Hércules para as telas em Hércules (Le Fatiche di Ercole) de Pietro Francisci estrelado por Steve Reeves (1926-2000) e a belíssima Sylva Koscina que inaugurou o sub-gênero “Sandálias & Espada” (na verdade, os americanos usaram esse codinome que aqui nunca pegou! Mas o gênero sim fez imenso sucesso entre nós. Para ser justo o êxito veio via EUA, onde um exibidor atrevido comprou para o mercado americano e fez maior propaganda do primeiro da série, que não era era muito ruim. Ao menos as crianças e jovens adolescentes já que nunca tínhamos visto nada como ele (Steve Reeves era realmente Mr. Universo precursor de Arnold Scharzernegger, só que com cara de galã e corpo menos agressivo. Poucos sabem que foi descoberto pelo pior diretor de todos os tempos, Ed Woos Jr, que fez Jail Bait, 54 e estrelou com Debbie Reynolds e Jane Powell o musical da Metro, Tentações de Adão, 54.
Na Europa fez uma série de filmes todos bem sucedidos (O Diabo Branco, 59, Os Últimos Dias de Pompéia, 59, Golias contra os Bárbaros, 59, Gigante de Maratona, 59, As Aventuras do Ladrão de Bagdá, 61, Rômulo e Remo, 61, O Rei dos Piratas, 60, A Guerra de Tróia, 61, Filho de Spartacus, 62, A Lenda de Enéas, 62, Sandokan o Grande, 63, I Pirati della Malesis e por fim, um faroeste, Vivo pela Tua Morte. Faleceu em 1 de maio de 2000 aos 74 anos, sempre muito discreto e bonitão. É mais curioso ainda lembrar dos outros halterofilistas que vieram após Reeves, incluindo até mesmo um que havia sido Tarzan, o Gordon Scott (1926-2007) que viajou para a Europa e viveu o semi deus em Hércules & O Conquistador (Ercole contro Morlock) de 1960 de Giorgio Ferroni. A resposta do público foi tão positiva que foi encomendada uma coprodução entre americanos e europeus para transformar os feitos de Hércules em série de TV, estrelada por Gordon Scott, mas o projeto ficou só no piloto entitulado Hércules & A Rainha de Tróia (Hércules & The Princess of Troy) dirigido por Albert Band em 1965. Em 1960, outro Hércules foi o também fisiculturista Mickey Hargitay em Os Amores de Hércules (Gli Amote di Ercole) dirigido por Carlo Bragaglia. Hargitay contracena com sua esposa, a famosa estrela Jayne Mansfield. Dan Vadis foi o quarto Hércules em O Triunfo de Hércules (Il Triunfo di Ercole) de 1964, dirigido por Alberto di Martino. Vadis apareceu em vários filmes de Gladiadores na Itália e, quando o ciclo se extinguiu, voltou aos Estados Unidos onde trabalhou em papeis menores em diversos filmes. Houve também um certo britânico Reg Park (1928-2007) que fez Hércules No Centro da Terra (61), do grande Mario Bava, seguido por Hércules na Conquista da Atlântida (61), de outro grande diretor Vittorio Cottafavi, Maciste nas Minas do Rei Salomão, Ursus Prisioneiro de Satanãs (64), - só que o cartaz mentia, o chamando de Hércules the Avenger! E O Desafio dos Gigantes, em que voltou a ser Hércules, 65. Imediatamente se aposentou!
No mesmo ano, os produtores Italianos trouxeram o ator americano Mark Forest para interpretar o herói mitológico em Hércules contra os Filhos do Sol” (Ercole contro el figli del sole), que voa alto na imaginação ao colocar o filho de Zeus em plena America do Sul em meio à civilização Inca. O público não ter se incomodava com as liberdades tomadas e, logo Forest voltou em Hércules& O Leão de Thebas (Ercole et Leone di Theba) que coloca Hércules como guardião da belíssima Helena de Tróia, vivida por Yvonne Furneaux (que trabalhou em A Doce Vida de Fellini). Outra variação do mitológico guerreiro foi Alan Steele em dois filmes: Hércules Contra Roma (Ercole contro Roma), de 1964 e Hércules contra os Homens da Lua (Ercole e la Regina di Samar) onde o herói enfrenta alienígenas (!!) que ressuscitam a múmia de uma Rainha para destruir os italianos. Outros interpretem incluem Brad Harris em 1962 em A Fúria de Hércules (La Fúria di Ercole) dirigido por Gianfranco Parolini, Kirk Morris (que era italiano) em 1963 em Hércules, Sansão & Ulysses (Ercole sfida Sansone) que o reúne com outros heróis lendários e Reg Park em dois filmes: Hércules na Conquista da Atlântida (Ercole Allá conquista di Atlantide) e “Hércules no Centro da Terra” (Ercole al centro della Terra) ambos de 1961. No primeiro o Leão do Olimpo chega à lendária cidade para enfrentar sua maléfica Rainha que planeja dominar o mundo e o segundo, dirigido pelo respeitado cineasta italiano Mario Bava, mostra o herói em busca de sua esposa em um reino subterrâneo dominado por um Imperador louco interpretado por Christopher Lee. No final da década, o gênero acabava sendo substituído por outro ainda mais popular e bem sucedido em bilheterias, o faroeste sphagetti. E fora Reeves o único que teve realmente êxito no final do gênero foi o italiano Giuliano Gemma (que era acrobata).
Em 1969, houve uma produção B mais cômica estrelada pelo futuro Terminator Arnold Schwarzenegger (que então usava o nome Arnold Strong) chamada Hércules em Nova York (Hercule in New York) que nada acrescenta ao personagem. Hércules também foi coadjuvante em dois filmes americanos: a aventura épica Jasão & O Velo de Ouro (Jason & The Argonauts) de 1963 vivido por Don Chaffey, que conta com os impressionantes efeitos de stop-motion do mestre Ray Harryhausen e a paródia Os Três Patetas Encontram Hércules (The Three Stooges Meet Hercule) de 1962, onde o papel ficou com Samson Burke. Com o objetivo de resgatar o glamour daquelas aventuras, o diretor italiano Luigo Cozzi contratou Lou Ferrigno (o Hulk do clássico seriado de TV) que foi Mr. Universo e, curiosamente, perdeu o título de Mr.Olympia para Schwarzenegger, para reviver o herói Olimpiano em 1987 no filme Hércules 87 (Hercules) em que este contracena com o ex-intérprete do herói Brad Harris, este no papel de um gladiador. O filme fez relativo sucesso, o suficiente para gerar uma sequência, As Aventuras de Hércules (Le Avventure Dell incredible Ercole), do mesmo diretor que agora coloca o personagem na busca de sete raios de Zeus roubados do Olimpo.
Hércules foi usado em três animações: a primeira foi em 1963 produzida pelo Oriolo Studios associada a Trans-Lux e ACT (Adventure Cartoons for Television) entitulada “O Poderoso Hércules” (The Mighty Hércules). Nele, o herói combatia as forças do mal com a super-força adquirida por um anel e contando com o auxílio do centauro Newton. A animação fazia uma leitura bem infantilizada do herói mitológico e agradou as crianças da época alcançando a marca de 130 episódios de 5 minutos de duração cada, tendo sido exibido no Brasil através do SBT. Em 1977, o herói olimpiano foi jogado em uma aventura espacial no desenho para TV “Sentinelas do Espaço” (Space Sentinels). Durante um longo tempo o personagem perdeu espaço tanto na TV como no cinema. A Disney o adaptou para um longa animado produzido em 1997. Hércules do estúdio de Mickey & Donald alcançou grande sucesso, sendo indicado a prêmios e gerando até uma série animada. Na versão da Disney, Hércules é filho de Zeus e Hera, sendo adotado por Alcmena e Anfitrião.
Em 1994, o produtor e diretor Sam Raimi (da primeira trilogia do Homem Aranha com Tobey McGuire) juntou-se ao produtor Robert Tapert para realizar telefilmes que formassem um pacote voltado para canais regionais. Assim, ambos resgataram o personagem mitológico em 5 filmes que traziam Kevin Sorbo como Hércules e o veterano Anthony Quinn como Zeus. A grande audiência desses filmes levaram a Universal a encomendar a série de TV Hércules – the Legendary Journeys. Entre 1995 e 1999, Kevin Sorbo conquistou o público como um semi deus altruísta, dedicado a reparar o mal causado pelos Deuses. Em vez de um herói consumido pela tragédia, o Hércules de Kevin Sorbo é um homem honrado e justo que perdeu sua família, mas não pelas próprias mãos, e que cruza o mundo da antiguidade com o amigo Iolaus sempre enfrentando terríveis desafios. O tom é de aventura e humor, principalmente pela pegada pop que Raimi deu às história ao fazer referências a elementos da atualidade. O sucesso da série ainda gerou a spin-off Xena – a Princesa Guerreira estrelada por Lucy Lawless, que fez ainda mais sucesso que a série de Sorbo. Ainda houve o seriado O Jovem Hércules (Young Hércules), estrelado por Ryan Gosling, também produzido por Raimi & Tapert mostrando a juventude do herói que é mostrado frequentando a Academia de Quiron, que na mitologia era o centauro que ensinou a Hércules a arte da guerra. A ideia de mostrar um Hércules mais jovial foi usada no filme de Renny Harlin Hércules (The Legend of Hercules) com o personagem encarnado pelo inexpressivo Kellan Lutz, que fez parte do elenco da saga Crepúsculo. O filme reinventa a juventude de Hércules, distanciando-o por completo de suas raízes mitológicas e aproximando-o mais da premissa de um Gladiador genérico. Agora, o personagem volta às telas vivido por Dwayne Johnson, vulgo “The Rock” no filme Hércules, dirigido por Brett Ratner (X Men: O Confronto Final) que também ignora os elementos míticos em favor de uma outra reinvenção, adaptada da HQ de 2008 Hércules: The Thracian Wars, de Steve Moore. A história, situada cronologicamente após os doze trabalhos, retrata o herói como um homem desiludido, desprovido de qualquer fator divino, liderando um grupo de mercenários que se rebela contra um rei cruel que ameaça o mundo antigo.
O fracasso comercial da versão de Dwayne não deve matar Hércules. Que ninguém duvide que esta não será a última vez que veremos o herói mitológico nas telas, ainda que desprovido de seus elementos originais que não só tratam de divindade, mas sobretudo, provação e redenção de uma figura trágica, atormentada cuja maior virtude é a de simplesmente sofrer como um humano. (por Adilson de Carvalho Santos)
Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho jornalista formado pela Universidade Catlica de Santos (UniSantos), alm de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados crticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veculos comunicao do pas, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de So Paulo, alm de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a dcada de 1980). Seus guias impressos anuais so tidos como a melhor referncia em lngua portuguesa sobre a stima arte. Rubens j assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e sempre requisitado para falar dos indicados na poca da premiao do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleo particular dos filmes em que ela participou. Fez participaes em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minissries, incluindo as duas adaptaes de ramos Seis de Maria Jos Dupr. Ainda criana, comeou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, alm do ttulo, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informaes. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionrio de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o nico de seu gnero no Brasil.