A Famlia das Letras
Um sobrenome ingls, Bront, claramente indica um universo. Anne Bront, que morreu aos 29 anos de tuberculose, a menos famosa das trs irms escritoras
Um sobrenome inglês, Brontë, claramente indica um universo. Anne Brontë, que morreu aos 29 anos de tuberculose, é a menos famosa das três irmãs escritoras, cuja vivência foi evocada pelo diretor francês André Téchiné num filme dos anos 70 do século passado. Agnes Grey (1847) é uma obra ainda menos conhecida que A moradora de Wildfell Hall (1848). Mas é inegável a força da sutileza do verbo de Anne nesta sua primeira tentativa romanesca, uma das duas tentativas que ela fez; na verdade é uma espécie de autobiografia disfarçada de ficção, pois sabe-se que Anne serviu como governanta em casa de ricos, assim como a protagonista que ela cria em Agnes Grey. A sinceridade, uma espécie de realismo passado e as extremadas delicadezas de suas frases-pensamento ainda são capazes, passados tantos anos, alguns séculos, de apaixonar o leitor que pode identificar, apesar das diferenças, algumas identidades no universo Brontë, cujo ponto-cume parece ter sido mesmo O morro dos ventos uivantes (1847). São colinas parelhas e agradáveis de subir, estes romances das Brontë.
Todo o início do penúltimo capítulo, “As areias”, é uma amostra excelsa da capacidade de escritora de Anne, sua lábia escrita para levantar do fundo das palavras ambientes e situações humanas. “But the sea was my delight; and I would often gladly pierce the town to obtain the pleasure of a walk beside it, whether with the pupils or alone with my mother during the vacations.” (“Mas o mar era minha delícia; e eu muitas vezes, alegremente, atravessei a cidade para chegar ao prazer duma caminhada ao longo dele, ora com as alunas, ora só eu e minha mãe, durante as férias.”). O leitor entra na cena, é um intérprete, é um autor: seduzido, deliciado. “Delightful!”. “It was delightful to me all times and seasons, but specially in the wild commotion of a rough sea-beeze, and in the brilliant freshness of a summer morning.” (“Era-me delicioso, em todas as épocas e estações, mas especialmente na comoção selvagem da brisa do mar, e no frescor luminoso de uma manhã de verão.”).
Quem nunca experimentou estas sensações antigas que Anne ressuscita com seu verbo? Com esta pergunta de tarde suave de domingo, encerro. E, como Anne ao cabo de seu romance, “and now I think I have said sufficent” (“e agora penso ter dito o suficiente”).
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a dcada de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicaes de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br