O Sucesso de Martha

A gaúcha Martha Medeiros é uma mulher de sucesso. Já saiu do Rio Grande do Sul e é lida em todo o país. Corresponde femininamente ao que representa no mundo masculino Luis Fernando Verissimo.

17/02/2013 22:21 Por Eron Fagundes
O Sucesso de Martha

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A gaúcha Martha Medeiros é uma mulher de sucesso. Já saiu do Rio Grande do Sul e é lida em todo o país. Corresponde femininamente ao que representa no mundo masculino Luis Fernando Verissimo. São ambos arautos da moderna crônica brasileira e são muito lidos porque falam dos assuntos da maioria numa linguagem da maioria. São textos simples e muitas vezes simplificadores.

Eu diria que o melhor de Martha  não são suas crônicas, que nunca dão a impressão de serem algo mais do que um apanhado jornalístico no sentido subalterno da expressão. Ela foi descoberta e vendida como cronista, caiu no agrado do público e aí continuou; submeteu  seus possíveis anseios literários a um jornalismo intermediário.

Com o sucesso de suas crônicas, Martha buscou sua realização como escritora, como ficcionista. Sua novela Divã (2002) virou até filme e ajudou a projetar ainda mais, nacionalmente, o nome de Martha. É uma situação desagradável para o analista dizer que a ficção de Martha consegue ser muito pior do que suas crônicas. Divã é um vomitório sem consistência. Mas Martha reiterou a ficção, embalada, claro, pelo sucesso (o sucesso não é necessariamente um bem, embora também não seja obrigatoriamente um mal; para a literatura de Martha, penso que muitas vezes foi um mal, como tentarei deixar entredito nas linhas que virão). Fora de mim (2010) é outra crônica narrativa em que o domínio de Martha sobre a arte de contar histórias em palavras se perde em movimentos desalinhados; uma pequena novela, próxima do conto, Noite em claro (2012), expõe igualmente os problemas de construção narrativa de Martha, a subjetividade em que a própria Martha parece autoficcionar-se sem muita autenticidade ao se questionar no início: “Um livro. Escrever um livro. Mas sobre o quê? Talvez sobre o psicótico que anda me mandando e-mails. Sou jornalista.”

Então, se as crônicas de Martha não transcendem, e sua ficção mofa antes de aparecer seu esqueleto, onde está o melhor de Martha, aquele lado que o sucesso lhe tirou e o público talvez vá ignorar para sempre? É a poesia de Martha Medeiros seu melhor estágio, onde ela anota: “quanto mais escrava/ mais escrevo/ pra libertar essa mulher da vida que me habita”. Ou resmunga: “a boca entreaberta pedia / um beijo pra me tatuar”. Isto foram outros tempos. Em nome do sucesso (que poesia nunca é sucesso), vamos ao ramerrão: às crônicas. Cronista de um jornal popular deve seguir o que o público dita. Nos anos 40 o crítico pernambucano Álvaro Lins constatou que o sucesso público estava interferindo no declínio circunstancial da obra do romancista gaúcho Erico Verissimo; se dirá hoje que, abandonando a poesia e dedicando-se a uma crônica mediana e a uma ficção deformada que vive à sombra destas crônicas, Martha alterou seu rumo literário e construiu um caminho onde o que parece interessar no momento é somente este sucesso público.

No entanto, virando a página, um livro recente da escritora, Um lugar na janela (2012) a redime parcialmente das soluções equivocadas de sua literatura e jornalismo. São apontamentos de viagens que Martha faz com uma veia poética. A paixão da viajante transborda de todos os textos. E uma das coisas de que ela se vale no imaginário de suas frases são as citações ao cinema, ela que, sabe-se, gosta de cinema. Surgem referências a O expresso da meia-noite, a Steven Spielberg e seu Tubarão, a Stanley Kubrick e seu O iluminado, a Alfred Hitchcock e seu Os pássaros, e por aí vai. E a um comentarista de cinema como eu isto acaba agradando e divertindo. No entanto, talvez o ponto alto de sua peregrinação geográfico-literário seja o momento em que, já separada do pai de suas filhas, apresentou a Paris seu namorado, um gauchão da fronteira. “Depois de 21 anos vivendo ao lado do mesmo homem, pai das minhas filhas, com quem fiz inúmeras e inesquecíveis viagens, me vejo em plena meia-idade separada e fazendo algo comumente associado à adolescência: namorando de novo.” É uma virada em suas viagens. Assim como o fim do livro coincide com o fim deste relacionamento, abrindo uma nova virada. “Dois relacionamentos importantes, com dois companheiros de aventura que fazem parte, hoje, da minha biografia afetiva (...) Desisto de tudo, menos de permanecer na estrada e conhecer melhor este planeta que nunca esgota minhas expectativas”. Cuido que as viagens estruturam melhor um texto de Martha Medeiros. A não ser que ela volte à poesia.

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