As Incompreensões para com Noé
Gaspar Noé traz em seus filmes uma respiração cinematográfica que transborda de qualquer espaço geográfico conhecido no globo


Gaspar Noé, um cineasta francês que nasceu na Argentina, traz em seus filmes uma respiração cinematográfica que transborda de qualquer espaço geográfico conhecido no globo. É um original este Noé, amando-se ou detestando-se o que ele se propõe mostrar numa tela de cinema. E sua originalidade nem sempre é bem compreendida pelos espectadores, sejam eles de que latitudes forem. Os conceitos esposados pela crítica padecem diante dos avanços estéticos trazidos pelo realizador. Aproximações? Talvez o francês Jean Eustache, talvez o italiano Pier Palo Pasolini: pela virulência radical e sombria de filmar.
Noé está em cartaz com seu novo filme, Love (2015), que tem dividido furiosamente os observadores desde sua exibição em Cannes. Há um indisfarçável moralismo nas opiniões que se espalham por aí. Que propõe Noé em Love, rodado em Paris mas falado inteiramente em inglês? Um olhar para o carnal como se estivéssemos tratando do espiritual. Emulando o dito do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, cujas demências de postulações o chegariam de Noé: escreve com tua carne, e verás que carne é espírito. Para que separar carne e espírito, não é mesmo? Amar alguém pelo prazer físico que dá o amor de alguém. Noé põe os excessos carnais dentro da alma das personagens.
É verdade que Noé atingiu o suprassumo de seus paradoxos artísticos em Enter the void (2010), um dos mais criativos filmes deste princípio milênio. Talvez a extraordinária sequência final de sexo desta obra-prima de há cinco anos tenha inspirado o todo da realização de Love, onde do princípio ao fim o espectador depara com a explicitação ampla das relações sexuais. Um grande bacanal de imagens, eis o que é Love. Para bem ou para mal, é uma proposta de choque, moral e estética, que tem desorientado quem decide pensar sobre o cinema contemporâneo; sua quase total falta de parâmetros deixa sem chão os pensadores habituais. Mas mesmo assim é um filme em que a tesão de ver, em todos os sentidos, pode dilacerar-nos inteiramente, gerando um perturbador prazer.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)


Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro Uma vida nos cinemas, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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