1917

O merito do filme nao eh apenas tecnico, pois os recursos narrativos estao a servico de uma historia bem elaborada que sabe evitar o ufanismo geralmente associado aos filmes do genero

25/01/2020 17:27 Por Adilson de Carvalho Santos
1917

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Na noite do Golden Globe 2020 confesso que fui um dos que se surpreendeu com a premiação de “1917”, se sobressaindo em meio a pesos pesados como “O Irlandês” e “Era uma Vez em Hollywood”. Ao assistí-lo pude entender como era justificada cada aplauso dado ao filme de Sam Mendes, o primeiro que o diretor de “Beleza Americana” (1999) e dos últimos 007 (Skyfall & Spectre) roteirizou, em parceria com Kristy Wilson-Cairns, a partir das memorias de seu avô, que lutara no front da Primeira Guerra.

O filme impressiona com o já alardeado uso do plano sequência, então esclarecemos aqui em primeiro lugar o que isto significa. Filmes são realizados com sequências cortadas, filmadas diferentes da ordem cronológica da história, e editadas na fase de pós-produção. Durante as filmagens erros são cometidos e várias tomadas são necessárias até que se alcance o efeito pretendido em uma cena. No plano sequência as filmagens seguem sem cortes, mas fazer um filme inteiro totalmente fluido e contínuo é de difícil realização. É possível, no entanto, criar a ilusão de uma tomada única disfarçando um número mínimo de cortes, tal qual fez Alfred Hitchcock em “Festim Diabólico” em 1948 dividindo os 80 minutos de projeção em 8 planos de 10 minutos, feito inédito então, mas que criou a ilusão de tempo real pretendida pelo mestre do suspense. Sam Mendes executa sua mágica com a mesma habilidade que Hithcock (Festim Diabolico), Orson Welles (A Marca da Maldade), Alejandro Iñarritu (Birdman) entre outros que souberam explorar a técnica com resultados admiráveis. No caso de “1917”, o filme disfarça seus cortes movendo a câmera para atrás de um objeto como uma árvore, onde a câmera pode ser operada sem que uma edição de imagem seja percebida.

O mérito do filme não é apenas técnico, pois os recursos narrativos estão a serviço de uma história bem elaborada que sabe evitar o ufanismo geralmente associado aos filmes do gênero. O filme de Mendes evoca na memória ecos de “Glória Feita de Sangue” (1957) e “Sem Novidades no Front” (1930) ambos também ambientados na Primeira Guerra (1914-1918) e expondo os horrores que a marcha belicista traz ao espírito humano. Mendes começa com um plano aberto no campo onde dois soldados britânicos descansam debaixo de uma árvore, e logo em seguida são despertados à medida que caminham para dentro de um labirinto de trincheiras que dividem o exército inglês dos alemães. Os soldados são incumbidos de levar uma mensagem até um batalhão inglês prestes a cair em uma armadilha que custará suas vidas. O patriotismo cego não move os passos dos jovens Blake (Dean-Charles Chapman) e Schofield (George MacKay), é mais pessoal, emotiva.O primeiro assume a missão pois seu irmão mais velho está entre os soldados sobreviventes e a um passo da emboscada, e o segundo é movido pela amizade e a promessa feita ao atravessar uma terra de ninguém. MacKay (Capitão Fantástico) conecta-se com o público, vive à flor da pele o significado de derramar sangue, suor e lágrimas. A travessia da terra de ninguém até o front ganha uma dimensão de incrível realismo graças à fotografia de Roger Deakins (Oscarizado em “Blade Runner 2049”) cujas imagens impactantes são o verdadeiro protagonista dessa história. Se a frase “esses são os horrores da guerra” já foi ouvida em outros filmes, o filme de Mendes as explora com precisão cirúrgica desde a mudança brusca de um idílico campo ao claustrofóbico ambiente de uma trincheira; ou da segurança desta para uma corrida desesperada com tiros e bombas sucessivas. A trilha sonora de Thomas Newman se mescla à ação de forma que corremos com o cabo Schofield e sofremos como se pudéssemos nos transportar para dentro da tela. Mesmo a rápida aparição de rostos conhecidos como Colin Firth, Mark Strong e Benedict Cumberbatch não nos distrai do principal na história, não o seu desenrolar, não é senso de patriotismo ou de dever cumprido, mas como o ser humano eclipsa em meio à destruição e morte, essas sim as únicas vencedoras de guerra.

O filme intitulado com o penúltimo ano da Primeira Guerra começa em 6 de Abril, data em que os Estados Unidos entraram no conflito. Com várias premiações e indicações, o filme conta com 10 indicações ao próximo Oscar, incluindo melhor filme e direção para Sam Mendes. Com tanta badalação, facilmente podemos entender porque mesmo que não completamente original, “1917” consegue o mérito de mostrar as possibilidades quando um realizador tem talento para reunir uma equipe capaz de mostrar o que é a sétima arte, não o que se faz, mas como se faz.

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Sobre o Colunista:

Adilson de Carvalho Santos

Adilson de Carvalho Santos

Adilson de Carvalho Santos e' professor de Portugues, Literatura e Ingles formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pela UNIGRANRIO. Foi assistente e colaborador do maravilhoso critico Rubens Ewald Filho durante 8 anos. Tambem foi um dos autores da revista "Conhecimento Pratico Literatura" da Editora Escala de 2013 a 2017 assinando materias sobre adaptacoes de livros para o cinema e biografias de autores. Colaborou com o jornal "A Tribuna ES". E mail de contato: adilsoncinema@hotmail.com

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