Escrevi a crítica na quarta–feira, mas por algum motivo ela não foi publicada. Talvez seja o destino. Porque na quinta, quando eu estava saindo da Record News, a editora me chamou e mostrou uma notícia que vinha dos EUA dizendo que um adolescente havia morrido, num incidente numa festa que justamente imitava a que o filme mostrava. Mais uma vez as pessoas subestimam o poder de imitação que o cinema provoca e a burrice (e a mania de copiar, o chamado copy cut) do ser humano. Isso só vem reforçar minha impressão de que este é um filme do mal. Mau exemplo é pouco. Juntando com a cabeça fraca de pessoas impressionáveis e está feita a desgraça.
A crítica original
Eu tentei desligar em mim, como se fosse possível, as influências de uma formação religiosa castradora e culposa, as preocupações que se tem como professor e autor de livros didáticos, a constatação que se vê diariamente com a demolição dos valores sociais (tiroteios e massacres em escola, alunos batendo em professores, alunos passando de ano automaticamente e assim por diante). Infelizmente como cidadão preocupado não consigo ser isento e escrever sobre Projeto X como se ele fosse apenas um filmezinho para ganhar dinheiro se dirigindo para adolescentes (ainda que nos EUA, onde foi R, só entrariam acompanhados de adulto. O resultado de bilheteria até agora é cerca de 42 milhões de dólares, mas ainda está pingando com uma média razoável). Todo filme de alguma maneira é político, todo filme ensina alguma coisa, em geral o mal.
De uma certa maneira, é verdade o que diz o crítico do New York Times que pergunta: “Será que este é o Clube dos Cafajestes da geração IPhone?” Talvez, com a diferença de que aquele filme era endereçado aos universitários e não aos teens. Infelizmente o brasileiro adoram imitar americano, inclusive em seus defeitos.
O que filme demonstra e é um fato: o jovem americano muito repremido parece ser obcecado em perder a virgindade (deveria ser um rito de passagem natural) e em geral vai para a Universidade simplesmente para exercer seus sonhos de transar e ser irresponsável. A ideia deles de ter um “good time” é beber muito até vomitar ou consumir drogas. Fico impressionado como o cinema mostra o consumo livre da maconha que ainda é uma droga proibida, não regulamentada. Quem fumar, ainda mais lá pode ir preso. E com frequência vai. Ou então drogas sintéticas (aqui é uma forma de ecstasy). E tudo de uma maneira cada vez mais comum entre nós (onde hoje mulher bebe muito e por vezes nem sabe com quem dormiu aquela noite), mostra a ação, mas não suas consequências (e este filme em particular é mestre em livrar a cara dos protagonistas).
Infelizmente na vida tudo tem consequências e nada é de graça. Qualquer pessoa que já viveu um tempo na América sabe muito bem que o que filme mostra é impossível de acontecer, simplesmente porque nos primeiros cinco minutos de barulho a polícia fecharia a festa e não se comportariam como idiotas como o filme mostra. O que vemos então é de fato um delírio do que gostariam que sucedesse, mas que na prática não é possível. É a festa dos sonhos de um teen nerd.
É verdade que as credenciais deste Projeto X são duvidosas. Um dos vários produtores aqui é Todd Phillips, que é o produtor/ diretor de Se Beber não Case I (ainda meio bobo), II (indesculpavelmente grosseiro, as cenas de bestialidade como o macaco são imperdoáveis) e o III (que vem por aí). Supõe-se que é ele que está por trás deste projeto barato (foi rodado basicamente com Câmera Digital de celular, ou equivalente, propositalmente com baixa qualidade. E quem fotografou foi o próprio elenco. Mais de 10 horas de material foi coletado). Mas na história ele é fotografado como se tivesse sido feito por um colega de escola meio estranho que registrou tudo e com quem o filme conclui.
Minha suspeita é que seria um autocrítica ou brincadeira, como se essa figura fosse autobiográfica (na festa surgem outras câmeras do mesmo teor que dão mais variedade ao filme). O fato que é uma coisa não possível na realidade é o segundo pôster do filme que diz “esta é a festa com que você sonhou”
Apesar disso, ele é vagamente inspirado num fato real, uma festa que sucedeu na Austrália – ou seja, com outras leis, mas também o costume de beber muito – de um certo Corey Waddington, em Delaney. Ele colocou o anúncio da festa no MySpace, atraindo 500 pessoas e causando danos de monta de 20 mil dólares. A festa atraiu a imprensa e terminou em quebra pau, sendo depois condenada pela opinião pública local. Ou seja, aquilo que se tem usado ultimamente para filmes de terror, desde A Bruxa de Blair até o recente e bom Chronicle/Podem Sem Limites.
Assim acompanhamos três amigos, que tem por volta de 17 anos e que vivem na região de Santa Barbara que fica uma hora e pouco de LA e é uma espécie de subúrbio rico. Thomas (feito por um ator chamado Thomas Mann, como o escritor) está fazendo 17 anos e não é nada popular na escola (outra vez atacam os bullies). São seus amigos um que veio da Costa Leste com sotaque e tudo J.B (Jonathan Daniel Brown), que é todo metido e acaba sendo o propulsor do projeto. Embora qualquer pai que já foi ao cinema saiba que não se deixa um adolescente em casa sozinho, os pais de Thomas cometem esse erro e vão passar o aniversário de casamento fora (o filme explora o fato de que o pai não tem exatamente orgulho de que o filho seja quadrado e pouco malandro). Resolvem então dar uma festa em sua casa rica com piscina, que vai fazer ele transar com a garota de seus sonhos e se impor na turma. Naturalmente como quem já deu qualquer festa sabe, ela fica fora de controle (porque colocam na internet e um grupo vai convidando outro) até que vira um bacanal americano, ou seja, lembra aqueles vídeos de Girls Gone Wild (com garotas bêbadas caindo na piscina e mostrando seus seios!). Ação realmente muito pouca e interrompida (no caso do herói, e isso Hollywood não muda. No meio do caos ele percebe que ama sua coleguinha de sempre e também é correspondido).
Quem dirigiu o filme é um certo Nima Nourizadeh (de origem indiana, mas sem créditos) com elenco desconhecido e o filme vai num crescendo de absurdos. Alguns fazem até rir. Tem as brincadeiras com o coitado do cachorro de estimação e vai ao clímax que é um incêndio na rua (provocado por um vingativo traficante de drogas). Tudo daquele jeito, sem consequências. Ou seja, totalmente irresponsável. E como eu disse ocasionalmente engraçado. Já que pelo menos no cinema, a gente até gosta de vez em quando de “não ser como na vida”, realizar nossos sonhos e delírios. Esse é o aspecto mais interessante do filme.