Esta é uma das obras-primas de Luchino Visconti (1906-1976), juntamente com o anterior Rocco e seus Irmãos. Certamente um dos filmes mais bem realizados de todos os tempos, uma perfeição de direção de arte, figurino e fotografia.
Todos realizados por mestres do ramo (sem esquecer a trilha musical que é do genial Parceiro de Fellini, Nino Rota, que contribuiu com uma bela trilha sinfônica entremeada de temas de Verdi e canções folclóricas da Sicília).
Uma adaptação de um bestseller mundial autobiográfico do Príncipe Giuseppe De Lampedusa (1896-1957) - que foi modificado em vários momentos pelo diretor), mas que teve a má sorte de morrer pouco antes de ver seu livro publicado e bem-sucedido. De certa maneira Visconti foi fiel ao livro, mas com outro ponto de vista, já que este era comunista e, portanto, a favor das mudanças e o autor naturalmente contra, já que perdeu seu poder e fortuna, chegando à miséria durante o fim da Segunda Guerra.
Como a história é pouco conhecida (a edição traz até artigo sobre o tema, já que poucos se lembram que a Itália era formada de pequenos principados e só através da luta armada de Garibaldi com sua bandeira tricolor que irá existir realmente o País que conhecemos como Itália).
Então a preocupação foi simplificar e tornar mais claro essa temática. Também não queria se estender e mostrar a morte do protagonista, no caso o Príncipe Don Fabrizio Salina (Burt Lancaster) da Sicília, preferiu prolongar a sequência do baile (durante praticamente uma hora de projeção) onde ele sente a presença da morte, sentindo que os tempos vão mudar e ele de certa forma está aceitando as mudanças (não tem escolha, se não arrisca mesmo ser morto assim com sua família).
Mas também percebe que terá pouco tempo de vida. Assim ele e sua época estão chegando ao fim. O projeto muito caro (teria custado US$ 2 milhões e 900 mil liras) foi iniciado pelo produtor Lombardo (1920-2005), dono da Titanus, que também foi entrevistado para a edição e se revela um homem educado e elegante. Ele foi produtor de Rocco, Cronaca Familiare de Zurlini, Os Noivos de Olmi, A Maja Desnuda, com Ava Gardner etc. Mas aqui chegou a entrar em falência (com o tempo se recuperou e pagou as dívidas), já que Visconti era famoso por seu rigor em usar material autêntico na cenografia.
Um dado importante: Visconti era de uma família não apenas aristocrática, mas eram os príncipes que mandavam na região de Milão, então além de entender do assunto, também de certa forma estava sua própria história (ao menos de sua família). Não chega a dar nostalgia ou lamentar, até porque era um rebelde homossexual e comunista. Mas humaniza a mudança de guarda, do poder, mesmo que com certo cinismo, na certeza que nada muda, as velhas estruturas irão prevalecer.
O filme foi rodado em locações, mas também houve grande trabalho de cenografia (a casa da família na cidade de Donna Fugata era apenas fachada, um set para o filme e o jardim onde aparecem os letreiros também não existia, foi produzido especialmente). Mas é nos incríveis figurinos de incrível bom gosto (Claudia veste um branco tão notável, que deixou a atriz com marcas de sangue na cintura) e na decoração de interiores que o filme é inigualável (foram usadas três palazzos diferentes em Roma e arredores).
Dizem que Zanuck, chefe da Fox, reclamou que as cenas de ação não são como as de faroeste e por uma boa razão eram brigas de rua, confusas e desajeitadas. Com mulheres se intrometendo e gente sendo fuzilada a esmo. Visconti queria outro elenco, pensando antes num ator russo que fez para Einsenstein, Ivã, o Terrivel Nicolai Cherkasob (mas este era alcoólatra e estava exilado na Sibéria),depois chamou Laurence Olivier (que recusou porque tinha outros compromissos) até quando a Fox, co-produtora, impôs Burt Lancaster (1913-1994).
Segundo Lombardo, Burt não conhecia direito a obra de Visconti e este não queria ter um americano cowboy no papel. Chegou a gelá-lo nos primeiros dias, mas Burt conseguiu conquistá-lo de tal forma que se tornaram amigos íntimos e Burt voltou a trabalhar com ele em Violência e Paixão (mais que isso na época Visconti já estava em cadeira de rodas e Burt garantiu pessoalmente o fim do projeto perante as seguradoras).
Os outros, porém, eram já protegidos do diretor, como Delon e Cardinale (ambos no auge da beleza) ou então foram descobertos e eventualmente se tornariam astros como Mario Girotti (depois Terence Hill), Giuliano Gemma (que faz o oficial que canta), Pierre Clementi de Belle de Jour como um dos filhos e as mulheres Ida Galli (estrelaria com Gemma - O Dólar Furado) e Otavia Piccolo (grande atriz no palco).
Todos dublados para o italiano na versão original, enquanto na americana só Burt usou sua própria voz (a pedido de Burt foi supervisionado por Sydney Pollack). Visconti dirigiu os atores como se fosse uma peça de teatro, fazendo antes ensaio de mesa, depois marcações deixando tudo pronto para a hora da rodagem. Burt tinha problemas com o joelho (o que atrapalhava na hora da dança com Claudia), mas conseguiu esconder o problema.
Uma coisa interessante que conta Piero Tosi é que ele descobriu que Garibaldi foi o primeiro a usar o que hoje se chama de "blue jeans", tanto que a partir dele passaram a exportar esse tipo de calça para os Estados Unidos. Toda a sequência do baile foi rodada em 44 dias, durante o auge do verão em agosto e todos sofreram muito (porém, todos comentam que Visconti, embora tivesse ataques ocasionais de nervos e ficasse furibundo, também era o pai da paciência). Não há dúvida que o filme resulta um pouco longo e lento, mas o curioso é que as versões reduzidas acabam funcionando menos.