Crítica sobre o filme "Tubarão":

Rubens Ewald Filho
Tubarão Por Rubens Ewald Filho
| Data: 20/11/2012

A frase de seu anúncio prevenia: “Don´t Go in the Water /Não vá à água”. E completava porque "depois deste filme você nunca mais entrará na água!” E alguns também traziam: “você gosta de peixes?... Porque eles também gostam de você”. Isso era completado por imagens misteriosas (os ataques eram mostrados pelo ponto de vista do agressor, do tubarão, principalmente porque o monstro mecânico nunca ficou pronto e perfeito conforme era a exigência do diretor Steven Spielberg).

Prejudicado por atrasos e problemas (principalmente porque demonstrou que o oceano é o ambiente mais imprevisível de todos para se rodar um filme), este longa acabou sendo um imenso estouro de bilheteria chegando a ser o número um em renda nos EUA (sendo derrubado apenas por Star Wars).

Foi ele que inventou a noção de blockbuster e desde então o cinema, ao menos nos verões, nunca mais voltou a ser o mesmo. Continua a ser um excelente thriller, em particular, na metade final que é praticamente toda em cima de apenas três atores e o tubarão branco (que a gente só se vê de perto depois de uma hora e 14 minutos!).

Eu nunca tinha visto o filme na íntegra desde sua estreia nos cinemas, quando o assisti por duas vezes e fui daqueles que o louvou (na época éramos todos grandes fãs de Steven Spielberg desde que o tínhamos descoberto no seu telefilme que passou aqui nos cinemas, Encurralado (Duel, 1971). É preciso não esquecer que este foi apenas seu segundo longa-metragem para o cinema, que o primeiro foi Louca Escapada (The Sugarland Express, 74) que ganhou prêmio de roteiro em Cannes, mas não foi um grande sucesso.

Foi produzido pelos mesmos que fizeram Tubarão, o recém-falecido Richard Zanuck, filho de Darryl (1934-2012) e seu parceiro David Brown (1916-2010). Na verdade, o livro foi descoberto porque a mulher de Brown, era Helen Gurley Brown (1922-2012), editora permanente da revista feminista Cosmopolitan, que vinha muito ao Brasil conversar com Fatima Ali, editora de Nova, sua versão nacional. Foi esta quem descobriu o livro mesmo antes dele ser editado e o recomendou para o marido.

O custo dos direitos foi 174 mil dólares. Aliás, segundo o IMDB o orçamento do filme foi de apenas oito milhões de dólares (mas era muito para a época). O autor era Peter Benchley (que faz pontinha em Tubarão como um repórter embora três de seus scripts tenham sido rejeitados por Spielberg e eles tenham brigado feio quando o autor reclamou da morte de um personagem (explico melhor mais tarde).

Benchley (1940-2006) era filho de um escritor conhecido (Nathaniel Benchley, autor de Os Russos Estão Chegando e Está Sobrando um Espião) e neto de um ator e humorista muito conhecido no cinema dos anos 40, Robert Benchley (1889-1945), que fez 86 filmes, entre eles Correspondente Estrangeiro de Hitchcock e A Incrível Suzana, de Billy Wilder e inúmeros curtas-metragens humorísticos, além de ter ficado famoso como editor da revista Vanity Fair e por fazer parte de grupo dos intelectuais do Hotel Algonquin.

Nem é preciso dizer que o livro Tubarão foi um best-seller incrível, ficou semanas em primeiro lugar e até eu sucumbi e acabei não apenas lendo-o e também gostando já que na época achávamos alguma semelhança da cidade marítima do livro com aonde eu nasci, Santos, onde com frequência governantes escondem as verdades dos habitantes por interesses econômicos, ainda mais naquele tempo de ditadura amordaçada.

Ele estreou com muito atraso aqui no Brasil, como era hábito. Lá nos EUA foi no verão, mas aqui na época de Natal, e eu me lembro de ter ido ver o filme enfrentando fila e multidão (na época já era crítico, mas não tínhamos a mordomia de ver antes em cabines e pré-estreias).

E também as famílias iam ao cinema principalmente no Ano Novo, ao contrário de hoje em dia onde preferem fugir da cidade grande e se refugiarem em qualquer lugar distante, praia ou mato. Peter Benchley continuaria escrevendo com menos êxito, mas falando de assuntos correlatos. Foram filmados dele A Ilha (80) com Michael Caine (sobre piratas modernos que vivem no Caribe) e O Fundo do Mar (The Deep, 77) com Jacqueline Bisset, sobre caça ao tesouro.

Mas voltando a Spielberg, achávamos, na época, que ele era um gênio e não estávamos tão errados. E ficamos horrorizados quando ele não foi indicado ao Oscar como direção, que foi parte de um preconceito que a Academia tinha contra ele e custou a vencer (eu na época ainda não fazia a transmissão do Oscar), claro que hoje tudo mudou e ele deve ser indicado de novo este ano por Lincoln. Mas esta edição chega a mostrar uma gravação dele assistindo a indicação ao prêmio e vendo que não foi indicado, o que enfrenta com bastante humor, mas visível mágoa. Lógico porque foi mesmo injustiça e absurdo. O filme não poderia ter sido feito por outro com a mesma criatividade e vigor.

Não há dúvida que era um risco para a Universal colocar um diretor sem muita experiência em um filme grande, mas não se esqueçam de que ele era cobra criada, fez todo seu aprendizado no estúdio onde ficou anos dirigindo telefilmes e episódios de séries.

Nesse meio tempo virou amigo íntimo dos dirigentes. Não é preciso ser muito esperto para ver que ele era afilhado não só do diretor da MCA, agência dona do estúdio, mas do próprio chefão absoluto dela Sid Sheinberg. E não é por coincidência que a mulher de Sid, Lorraine Gary (1932 e ainda viva) faz o principal papel feminino não apenas deste Tubarão como fez as continuações e participou ainda de outro filme de Spielberg, 1941.

Publicamente nunca falou mal dela, mas nem é preciso porque é evidente que ela é feia, má atriz e até compromete o resultado (na adaptação certamente pela cara dela, mudaram o livro onde a mulher do xerife tinha um caso com o cientista – ela aparenta ser velha demais para Dreyfuss). Parece que o produtor Zanuck queria o papel da esposa para sua própria mulher a atriz Linda Harrison, mas teve que se contentar com um prêmio de consolação, Sid mandou dar um personagem para Linda em Aeroporto 75, um cala boca como se diz por aqui.

O começo do filme, sem dúvida, ainda resiste bem, mas na época foi inteiramente inovador. Eram os anos 70 quando todo mundo fumava maconha (até Spielberg) então não é surpreendente ver jovens fazendo um tipo de luau ao lado de uma fogueira enquanto um casal se afasta, ambos bêbados para caírem n’água. Ele já cai duro antes de entrar na água, mas a loira (com os seios aparentes) enquanto está nadando sofre um puxão estranho e depois é jogada de um lado para o outro, não sabemos o porquê.

Mas advínhamos, claro, e nunca vemos o tubarão direito, como eu já disse, depois de uma hora e 15 de projeção quando temos aquele primeiro close dele abrindo a boca atrás de Roy Scheider. Um grande susto (antes Spielberg já tinha dado outro, quando Dreyfuss mergulha no mar para ver o casco de um barco e aparece um cadáver. Ele não gostava da cena e chegou a refazê-la de novo na piscina da montadora. Eu continuo a achá-la a pior cena do filme, até porque um mergulhador experiente como o cientista Dreyfuss não se assustaria daquele jeito).

Pouca gente se lembra, mas Spielberg não gosta do VHS e nunca permitiu que este Tubarão saísse nessa mídia, só depois em DVD e ainda assim sempre se recusou a fazer comentários em áudio! Tubarão foi premiado com os Oscars de som, trilha musical e montagem (Verna Fields era considerada a verdadeira autora do filme e magoado, Spielberg nunca mais trabalhou com ela! Embora ela tenha morrido em 1982 e Tubarão tenha sido seu último filme. Hoje não há dúvida de que os dois têm grande mérito no resultado).

Lee Marvin foi a primeira escolha de Spielberg para o papel de Quint, mas este mandou dizer que preferia ir pescar. Spielberg queria então Sterling Hayden, mas ele estava com problemas com o Imposto de Renda e não conseguiram chegar a um acordo.

Acabaram chamando um famoso escritor (The Man in the Glass Booth) e ator inglês, Robert Shaw (1927-78), de Golpe de Mestre, dos mesmos produtores, que, por acaso, também estava com problemas com o fisco e fugia para o Canadá durante os fins de semana por causa disso. Mas era uma pessoa muito difícil, que odiava Dreyfuss e que era muito gentil quando sóbrio, mas um demônio quando bêbado. E bastava um copo de bebida para sair do sério.

A cena onde ele conta a história dos marinheiros atacados por tubarões foi totalmente perdida porque estava bêbado. Mas pediu desculpas e a refez no dia seguinte, numa única tomada (dividida em dois planos, um mais próximo, outro mais distante, ambos brilhantes).

Depois do filme, Shaw ainda gozaria de certa fama fazendo alguns filmes como astro (Robin e Maria, Pirata Escarlate, Domingo Negro, O Fundo do Mar, Comando 10 de Navarone e Avalanche Express. Mas morreu de repente quando estava dirigindo um carro na Irlanda, de enfarto do coração, causado pelo alcoolismo. Com apenas 51 anos).

Uma cena filmada, mas não incluída na montagem final ou nos extras é quando o filho do xerife Brody está sendo atacado pelo tubarão e é salvo por um homem que se coloca na frente dele. Havia uma cena do corpo ensanguentado dele sendo levado pelo monstro. Mas Spielberg a retirou.

Segundo Spielberg, a ideia para introduzir Quint era mostrá-lo num cinema assistindo Moby Dick com Gregory Peck e achando os efeitos absurdos. Mas o ator não lhe deu os direitos porque não gostava do filme nem de sua interpretação. Charlton Heston foi considerado para o papel de Xerife Chief Brody assim como Jeff Bridges, Timothy Bottoms, Jon Voight e Jan-Michael Vincent foram pensados para o papel de Hooper que ficou para Dreyfuss indicado por George Lucas por causa de American Grafitti (o curioso é que, a princípio, ele recusou o papel).

Heston foi rejeitado por Spielberg porque achava que ele sempre fazia o herói e o público já saberia de antemão que ele mataria o tubarão. Heston ficou magoado e desde então se tornou inimigo e detrator de Spielberg. Por gratidão, Spielberg chegou a oferecer o papel do Xerife a seu amigo Robert Duvall, que sempre o encorajou a fazer o filme (mas este recusou dizendo que o longa o tornaria famoso demais!).

Roy Scheider (Roy Scheider 1932- 2008), vinha do sucesso de Operação França e por uns tempos gozou de muito prestígio, estrelando filmes como All That Jazz, de Bob Fosse, Maratona da Morte, O Comboio do Medo, Trovão Azul, 2010 - O Ano em que Faremos Contato, A Casa da Rússia. Mas teve um problema de saúde que preferiu esconder (um derrame no rosto) e dali em diante teve que enfrentar outra doença ainda mais grave, o mieloma múltiplo.

Tubarão foi o primeiro filme a alcançar a renda de 100 milhões de dólares (não esqueçam da inflação) chegando a 65 milhões de espectadores. Seu sucesso durou todo o verão, porque as pessoas iam assisti-lo mais de uma vez. Mas também por outra razão. O diretor da Universal não quis exibi-lo em todas as salas, reduzindo-as para apenas 490 cinemas. Segundo ele, as filas nas portas do cinema era a melhor propaganda (grátis) que podiam ter!

Não há atores coadjuvantes muito famosos no filme, o primeiro a ser contratado por Spielberg foi Murray Hamilton (1923-86) que na época tinha um rosto conhecido e foi chamado para ser o prefeito de Amity. Mas o filme não lhe rendeu grandes oportunidades. Nem ao cachorro de Brady, que, na verdade, era o bicho de estimação do diretor. Outro detalhe: o barco de Quint se chama "Orca", ou seja, A Baleia Assassina (depois nome de uma das inúmeras imitações de Tubarão), mas porque as Orcas são inimigos declarados dos tubarões.

Minha cena favorita, porém, eu nunca tinha percebido antes, mas no blu-ray fica claro. É uma sequência noturna quando Brody está carregando seu revólver e no céu vemos uma estrela cadente cruzando o infinito. Real, não um efeito ótico.

Em 2004, a revista inglesa Empire votou em Tubarão como o décimo melhor filme de todos os tempos, mas em 2008 ele subiu para o quinto lugar. A trilha musical ficou em sexto lugar dentre as melhores trilhas de todos os tempos do American Film Institute. Mas o preconceito contra filme de suspense e terror estava presente quando ele ficou em 48 na lista de 1998, dos melhores filmes de todos os tempos do mesmo AFI (em 2008, baixou para 56). O Tubarão foi votado pelo mesmo AFI em 18 na lista dos grandes vilões, mas na listagem dos thrillers ao menos ficou em segundo lugar.

É mentira que Spielberg não deixou usar a cor vermelha, a não ser no sangue das vítimas já que ela é vista constantemente, inclusive na bandeira americana. A maior parte do filme foi rodada com câmera na mão. Depois do longa criou-se uma espécie de histeria com o público assustado com tubarões (que os confundia com golfinhos e baleias).

Bruce foi utilizado durante anos como atração nos parques do Estúdio Universal em Los Angeles. No script original (atenção Spoiler) Quint morria afogado quando a corda do arpão se enrola em seu pé e assim é puxado pelo tubarão (no filme seu final é muito mais visceral e forte, para não ficar igual a Moby Dick, mas o autor odiou).

Ser comido pelo tubarão é o final mais lógico para seu personagem mesmo. Também muitos foram contra a ideia do tanque de ar comprimido ser usado como último recurso (foi considerada a possibilidade de depois de tudo, Brody olhar para trás e se ver perseguido por um monte de outros tubarões).

Quint´s name comes from the Latin word for "fifth". Quint is the fifth person killed by the shark (after Chrissie Watkins, Alex Kintner, Ben Gardner´s disembodied head in boat, and Michael´s sailing teacher). Outro que morria no livro é Hooper, certamente moralisticamente também por ter um caso com a esposa de Brody. Sua morte estava no script, morrendo na jaula, mas não conseguiram fazer um ataque convincente do tubarão e o deixaram sobreviver. Outro Corte: No livro, o prefeito também não quer interditar as praias porque está sendo chantageado pela máfia. Ela investiu na região e espera ganhar muito dinheiro por lá.