Crítica sobre o filme "Tempo e o Vento, O":

Rubens Ewald Filho
Tempo e o Vento, O Por Rubens Ewald Filho
| Data: 27/09/2013

Mais uma adaptação do célebre e clássico romance homônimo de Érico Veríssimo (1905-75), mais precisamente de seu primeiro tomo. Para mim a obra-prima de um grande escritor (li toda sua obra e continuo a ser grande admirador de Érico e também de seu filho Luis Fernando Veríssimo), que passa agora por mais uma adaptação, portanto dispensável. Desta vez dirigida por Jayme Monjardim (seu primeiro longa para cinema desde Olga, 04) com roteiro do especialista gaúcho Tabajara Ruas e Leticia Wierzchowski (que escreveu a bem sucedida minissérie A Casa das Sete Mulheres, 2003, que tinha bastante a ver com a temática).

A primeira versão que eu conheci no cinema do livro foi de 1956, com O Sobrado, da Brasil Filmes, rodada nos estúdios da Vera Cruz pela dupla criativa da então TV Tupi, Walter George Durst e Cassiano Gabus Mendes. Centrada apenas no cerco do Sobrado da família tinha gente famosa até hoje como Lima Duarte, Lia de Aguiar, Márcia Real, Fernando Balleroni (que foi marido de Laura Cardoso), Luiz Gustavo, Barbara Fazzio. E conservo uma boa lembrança.

Depois teve uma versão para a teve em 67 seguida de várias para o cinema, dividindo o livro em diversos filmes: Um certo Capitão Rodrigo, 71, foi feito na última fase da Vera Cruz, por Anselmo Duarte, produção de Walter Hugo Khouri, prejudicado por um elenco fraco (Francisco Di Franco, quando deveria ser Tarcísio Meira, a desconhecida Elsa de Castro que continuou assim). No mesmo ano também foi feita Ana Terra, de Durval Garcia (que havia sido presidente do INC) e estrelado por sua mulher italiana Rossana Ghessa e Geraldo D´El Rey. Finalmente a Globo faria sua versão em minissérie com trilha musical de Antônio Carlos Jobim, com Lillian Lemmertz (como Bibiana), José Lewgoy, Paulo José, agora sim Tarcísio, Bete Mendes, Gloria Pires como devia mesmo foi Ana Terra). Walter Campos, Denise Saraceni e Paulo José assinaram a direção. 

Está refilmagem parece ter tido uma história atribulada de produção (assinada por Rita Buzzar a mesma de Olga), segundo contam porque foi uma das vítimas do Polo de Paulínia e o prefeito irresponsável, que cancelou o projeto na última hora. Então nem tudo saiu como o planejado, sendo que como está se tornando um habito, o filme perdeu em metragem (principalmente a história do Sobrado parece apressada e mal contada, parece que isso será remediada na versão posterior que será exibida na Globo e também lançada em DVD).

Trata-se na verdade de um épico com cara de faroeste (até porque a paisagem gaúcha se presta as grandes cavalgadas e cenas de embate e luta) aproveitando os frequentes conflitos que existiram entre diversos grupos e famílias locais. Como o brasileiro não sabe cultuar ou sequer estudar sua história, a maior parte dessas guerras não dá bem para entender, mas fica-se sabendo basicamente que há inimigos figadais, de várias gerações, que irão se enfrentar finalmente quando o casarão (O sobrado) da família ficará cercado pelos rivais (mesmo quando uma das mulheres está grávida e prestes a parir). 

O livro tem uma dimensão enorme, porque no primeiro volume utiliza justamente o Sobrado para fazer suspense e criar interesse enquanto aos poucos se vai mostrando como a família foi se formando com a ajuda de roceiros, emigrantes, índios, guerreiros, uma autentica mistura racial que são narrados nos capítulos dedicados a Ana Terra (que tem um filho de um índio, ou seja, um mestiço, aqui Ana é vivida Cléo Pires e os coadjuvantes mal chegam a registrar). Depois disso vira o Certo Capitão Rodrigo que é o mais perto de um herói de western que Erico procurou criar. Guerreiro incansável, lutador, briguento, mulherengo, ele descansa entre embates se apaixonando pela jovem Bibiana (Estiano) com quem consegue se casar, apesar da oposição da família, mas não nasceu para viver amarrado e logo irá partir para novas aventuras. Quem interpreta Rodrigo é o nosso Clark Gable, Thiago Lacerda, nunca tão parecido com o antigo astro, enquanto a maquiagem enfatiza seu rosto que deveria estar queimado do sol, o indefectível sorriso de dentes brancos, sua postura de cavaleiro e seu amor entusiasmado.

Ao conservar a estrutura do livro (fora este volume há mais dois em que Erico dramatiza a geração seguinte da família e que nunca se lembram de adaptar) foi fácil também modificar. Bibiana já velha passa a ser vivida por Fernanda Montenegro e originalmente vivia sofrendo sozinha e lamentando a passagem do tempo e a saudade do capitão. Agora o fantasma dele reaparece para vir buscá-la, mas antes disso ficam rememorando o passado (ela que conta a história de Ana Terra e logicamente a de Rodrigo) continuando como narradora até o final grandiloquente. 

Se o elenco não tem grandes surpresas ou momentos excepcionais, também não se compromete. Aliás, o mesmo se pode dizer de todo o filme, que tem bonita fotografia (não fosse do grande Affonso Beato) que compensa a irregular direção de arte, a ausência de sotaque (na verdade, alguns têm outros não, faltou rigor para eliminar de todos). O principal defeito é novamente a mania de Jayme de gostar de trilhas musicais retumbantes. Desta vez de Alexandre Guerra (que fez a bela minissérie Maysa) que mais uma vez é incessante (se esquecendo do valor dramático dos silêncios) e chega a ter ao final, corais de anjos (ou o que valha), mas é pouco regional e sente-se a ausência de temas gaúchos. Ainda faltam também (certamente por falta de recursos) melhores cenas de confrontos, batalhas, lutas, roubando da história seu valor como aventura.