Crítica sobre o filme "Dunkirk":

Rubens Ewald Filho
Dunkirk Por Rubens Ewald Filho
| Data: 26/07/2017

Sem nenhuma dúvida o trágico e lendário episódio de Dunkirk (ou Dunquerque) sempre foi para mim o mais fascinante, notório e menos explicado incidente da primeira fase da Segunda Guerra Mundial. Um fato real que reuniu soldados da Bélgica, do Império Britânico e da França, todos cercados pelo Exército nazista alemão que haviam acabado de tomar o território da França, aliás em tempo inesperado, e conseguiram deixar os sobreviventes aprisionados numa região pequena, todos eles numa praia sem poderem escapar para a Inglaterra. Embora pudessem ver o país na praia de Dunquerque não havia como sair dali, porque tinham ali um mínimo de aviões e navios (porque os que sobravam eles queriam ainda guardar para se defenderem os nazistas!). Importante: estavam ali no Canal da Mancha, que era muito raso e ficava submetido as marés! Ou seja, tão perto e no entanto tão longe. Sempre achei a história incrível mesmo tendo sido algumas vezes adaptada para o cinema (aqui foram rodadas em locações autênticas, mas também em Dorset, Holanda, a Duna Dewolf que fica na França, explosões em Palo Verde California, e nos estúdios Warner Burbank). Mas não se sabe bem ainda seu orçamento - supõe-se 150 milhões de dólares - porque foi rodado em IMAX e restaurado o antigo sistema de 65-70 milímetros! Mas não serão exibidos em Terceira Dimensão, que certamente não faz a menor diferença.

No mundo do cinema a história de Dunkirk ficou mais famosa justamente com o clássico A Rosa da Esperança (Mrs Miniver, 42, de William Wyler), que deu o Oscar de atriz para a inglesa Greer Garson desde então superestrela (foram 6 Oscars inclusive para diretor Wyler na época já lutando na Guerra e ainda 7 indicações). Ela fazia uma das donas de casa que fizeram tudo para salvar os soldados que estavam sendo dizimados em céu aberto pelos nazistas. Em 1950, o filme ainda gozando o clima de patriotismo teve uma continuação mais fraca, Romance de uma Esposa (The Miniver Story) sempre com Walter Pidgeon fazendo o marido de Greer. Curiosamente não houve muitas versões para o cinema. Era bom O Drama de Dunquerque (58, com John Mills, Richard Attenborough) ainda em preto e branco, depois os franceses contaram seu lado da história estrelada por Jean Paul Belmondo e dirigido pelo franco-árabe Henri Verneuill como Gloriosa Retirada (Weekend a Suydcoote, 64, ainda com Catherine Spaak). A mais bela de todas foi apenas uma longa sequência apresentada em Desejo e Reparação (Atonement, 2007, de Joe Wright), um dos meus filmes favoritos do século, com Vanessa Redgrave, Keira Knightley e James McAvoy (teve cenas curtas mas incríveis rodadas sem cortes). Só por referência há ainda dois filmes ingleses menores sobre os fatos, Dunkirk (04, com Timothy Dalton ex-Bond, semi documentário também com Benedict Cumberbatch) e Operation Dunkirk (17 com Ifan Meredith e Kimberley Hews).

O Gênio Nolan

Se já havia um Cult muito grande ao diretor britânico Christopher Nolan, porque causa de sua brilhante carreira revelada depois do original e espantoso Amnésia (Memento, 2000), um thriller contado às avessas que já lhe deu o sucesso, prêmios e a originalidade (usando uma história de seu irmão Jonathan, que continua a ser o habitual parceiro de projetos!), o mais incrível foi a Warner acreditar nele tão rapidamente que a seguir realizou a trilogia de Batman Begins, não apenas acertando na figura de Christian Bale como Batman, mas dando uma credibilidade aos personagens e situações que permanece até hoje em especial desde a inesquecível interpretação de Heath Ledger, premiada com o Oscar, como o Joker/Coringa em O Cavaleiro das Trevas, 08. Finalmente novo Batman, O Cavaleiro das Trevas Ressurge, 12. Pensando bem depois da trilogia Nolan bem que poderia se aposentar para o resto da vida. Sua reputação está feita só que não para de crescer.

Fez também o delirante A Origem (10) e depois o ainda mais ousado Interstelar,14. Não conheço do curta Quay, um documentário de 8 minutos sobre os Irmãos Quay na Warner! O fato é que com este Dunkirk e a reação espetacular da crítica americana (e boa bilheteria de 50 milhões de dólares no primeiro fim de semana) já se pode arriscar e apostar que ele finalmente será premiado com os Oscar de melhor filme e direção. Não seria mais que justiça. Ao menos há muito tempo eu não vi um filme tão brilhantemente realizado, com um domínio técnico espetacular, inclusive nas interpretações. A fotografia de Hoyte Von Hoytema, um suíço pouco conhecido até hoje que fez com ele Interstelar, outro ignorado pelo Oscar foi lembrado por poucos entre as parcerias deles, o Bafta por Interstelar e o thriller britânico O Espião Que Sabia Demais. Também fez iluminação e foto de Ela e 007 contra Spectre.

Não faça download deste filme, é preciso ver na tela espetacular do Imax porque o resultado é antes de tudo comovente, acho que faz muito tempo que eu não reajo tão fortemente a um filme, não enfrento cenas tão emocionais, que as vezes até me levaram ao choro. E que não via cenas encenadas com tanta destreza e eficiência. E olha que há um mínimo de diálogos, numa metragem também pequena. Mas será um absurdo se não ganhar também um novo Oscar de trilha musical para o alemão Hans Zimmer, que com Nolan concorreu por Interstelar, A Origem e hoje já tem 110 créditos. É um escore retumbante e sofrido, quase um vagido de dor, que nunca cai em patriotismos (o filme ao contrario deixa soltas ironias e críticas da época aos fatos para quebrar o excesso de sentimentalismo).

Não sei se não seria interessante antes de ver o filme folhear um livro da História da Segunda Guerra ou mesmo no último caso uma Wikipedia, porque nem todos os fatos são destrinchados (por exemplo, a razão porque Hitler e seus asseclas não enviaram mais forças armadas e aéreas para acabar logo com o poder britânico. Foi um erro estratégico incrível e a benção para os ingleses que nos próximos anos lutariam corajosamente com todos os recursos que conseguirão enquanto Hitler iria fazer outras invasões, como a da Rússia).

Enfim, conhecendo mais detalhes só irá aumentar a emoção de irmos conhecendo aos poucos os atores poucos deles conhecidos (como Kenneth Branagh e o recém premiado com o Oscar, Mark Rylance, Cillian Murphy que foi O Corvo e esteve em A Origem). Enquanto isso, outro famoso Tom Hardy fazendo Farrier está irreconhecível e encoberto! O protagonista é um jovem desconhecido e descoberto para isso, um tal de Fioon Whitehead, mas todos os outros jovens estão igualmente eficientes. Embora o gesto mais bem-sucedido comercialmente tenha vindo a ser a interpretação pouco falada mas muito eficiente de um astro da música pop, Harry Styles, ex do One Direction. Que deve ajudar ainda mais o resultado do filme.

Enfim, um cineasta favorito da crítica e de muitos espectadores parece ter chegado a seu apogeu e merece todos elogios e justas premiações. Salve Mr. Nolan!