Apesar de menos celebrado que Griffith ou Eisenstein o francês Abel Gance (1889-1981) foi também um dos pioneiros do cinema, um grande mestre repleto de inventividade e vontade de experimentar. Mesmo que sua carreira seja julgada quase que só por sua obra-prima, essa ambiciosa biografia de Napoleão que só vai até seu primeiro grande triunfo, a campanha da Itália. Mística e reverente, é muito ajudada pela magnética atuação de Albert Dieudonné (1889-1976), que foi tão afetado pelo papel que depois só o repetiria, dando palestras sobre Napoleão e por fim tendo alucinações em que se tornava o próprio imperador! Mas é mesmo pelo virtuosismo técnico do filme que Gance entrou para a história: fusões e sobreposições de imagens, câmera ágil (por vezes na mão ou pendurada para dar rasantes sobre a ação), montagem dinâmica e criativa, muita iluminação dramática, tudo sempre usado em favor da narrativa e não gratuitamente. E a lendária tela tríplice, pré-Cinerama e Cinemascope, que Gance batizou de Polyvision, com três imagens captadas por câmeras diferentes projetadas lado a lado, proporcionando um efeito de widescreen. O próprio Gance interpreta o sanguinário Saint-Just e o poeta Antonin Artaud faz Marat. Cheio de clímax (a guerra de bolas de neve na infância, a batalha de Toulon, a Revolução durante o Terror), o filme ainda impressiona e está distante de ser só curiosidade ou peça de museu.