Crítica sobre o filme "Paixão de Joana D´Arc, A":

Luiz Felipe Tavares
Paixão de Joana D´Arc, A Por Luiz Felipe Tavares
| Data: 23/08/2016

Joana de Domrémy, a Donzela de Orléans, foi uma jovem camponesa que, no Século XV, liderou um exército à guerra para livrar a França da ocupação inglesa. Acreditando estar sob influência divina, Joana foi capturada, julgada e queimada viva com apenas 19 anos de idade.

Transposto o evento ao cinema por vários cineastas – Mélies, De Mille, Fleming, Rossellini, Luc Besson, dentre tantos outros -, a Joana D’Arc de Carl Th. Dreyer é a mais realista e sensível versão. “A Paixão de Joana D`Arc”, de 1928, que retrata o julgamento e a execução dessa figura histórica, é cinema em estado puro; um clássico singular na história do cinema. Dreyer usou a essência do cinema, a imagem, para mostrar a tragédia humana exclusivamente por closes no rosto dos atores. Os cenários, os vestuários e demais valores da produção são secundários, extremamente simples para não distrair a atenção do público da retratação da alma humana em sua forma mais íntima.

A interpretação de Renée Maria Falconetti, atriz de teatro que faz o papel de Joana, é considerada como um dos melhores, senão o melhor trabalho já realizado na frente das câmeras. É simplesmente magistral. Tristeza, agonia, medo, esperança e tantas outras emoções humanas são perfeitamente representadas por Falconetti apenas por expressões de seu rosto. O fato dessa ter sido a única incursão da atriz no cinema colabora por tornar única a sua atuação, sem comparações e, por infortúnio da atriz, eternamente ligada ao papel de Joana D’arc.

Relatos dos bastidores dão conta de que o diretor Dreyer, sempre muito exigente, torturou emocionalmente a jovem atriz, ao ponto de um colapso mental, para alcançar o resultado que vemos na tela. Outros relatos dizem o contrário, que foi uma colaboração do diretor e da atriz, sempre sintonizados na persecução do melhor resultado possível. Independente dos relatos da produção, a atriz sofreu de problemas mentais pelo restante de sua vida, tendo falecido no Brasil em 1946.

Além da interpretação de Falconetti, vários outros elementos colaboram para o impressionante realismo do filme. Nenhum ator foi submetido à maquiagem, pois Dreyer entendia que sua aplicação poderia ocultar, ou até mesmo mascarar, os verdeiros traços dos rostos dos atores. Dreyer também consultou os manuscritos oficiais do julgamento de Joana para escrever o roteiro. A transposição dos manuscritos para a tela mostra o lado humano de Joana sendo confrontado com a ausência de humanidade dos juízes. Autoritários, ameaçadores, dogmáticos, cujo intuito é apenas subjugar Joana, os juízes representam a inflexibilidade da Igreja diante da ameaça que a jovem representa aos seus interesses políticos.

“A Paixão de Joana D’Arc” convenceu ao mundo de que filmes também podem ser considerados como arte. O resultado é uma das mais importantes obras primas do cinema; um verdadeiro milagre na forma de película.