Este primeiro filme americano do brasileiro Walter Sallers (produzido por Robert Redford e falado em espanhol), é um road-movie com uma mensagem. Esta é uma estrada com algo a demonstrar, uma jornada através da América Latina, que procura nos convencer que somos latinos, que temos muito a ver com os parceiros de Continente. Mas duvido que muita gente fica convencida. Essa revelação serviu para o jovem doutor Ernesto Guevara no começo dos anos 50, que durante uma viagem de motocicleta da Patagônia até um hospital de leprosos na Amazônia, teve sua consciência despertada para os problemas sociais do continente, no que seria o começo - bem remoto - de sua consciência política e luta armada. A moto apelidada de A Poderosa é secundária, porque depois de meia hora ela se estropia e eles continuam a viagem a pé. Na verdade, se vê pouco do povo, da gente, e mesmo da paisagem para chegar a emocionar ou ter qualquer conclusão. Felizmente evitam qualquer discurso ou proselitismo. Nem mesmo de Che ele ainda é chamado. É apenas um jovem um pouco ingênuo, que não sabe mentir, que tem ideais e comete besteiras (como uma simbólica mas inútil travessia noturna do Rio Amazonas). Uma lição curiosa e bem contada, mas que nunca empolga, transcende ou ilumina.
Por acaso, eu li o livro há três anos atrás e não vejo porque todos ficaram tão apaixonados pelo projeto. Pouco acontece nele de interessante, aliás o roteiro do filme tenta torná-lo mais intenso mas ainda assim não encontram ninguém de interessante ou de conseqüência, a não ser participar de alguns bailinhos onde aprendem a dançar mambo ou tango. Melhor dizendo, não aprende. Tem uma namoradinha que o larga (uma cena tão discreta, o rompimento vem por carta, que chega a deixar dúvidas), algumas garotas com quem conversa. Mas o drama maior são eles andando e a moto quebrando. Não são perseguidos, não se vê nada especialmente turístico (fora Machu Pichu que na época ainda não era muito conhecido). E mesmo a generosidade com que trata os doentes no hospital fica no ar (pinta um conflito com a madre superiora que não é levado adiante).
Já que foi tão criticado por Abril Despedaçado, onde teve momentos de exuberância fotográfica, Waltinho desta vez opta pela simplicidade, rodando em Super 16 mm e evitando o mais estético. O que ele tem a favor é que está mexendo com um mito inatacável, ninguém pode ou irá falar mal de Che Guevara, ainda mais nesta encarnação juvenil, de boas intenções e poucas propostas (o mexicano Gael não compromete no papel, mas a melhor figura é mesmo o argentino Rodrigo de la Serna, principalmente porque pessoalmente é muito mais jovem. Aquilo que você na tela é composição mesmo de ator).