Crítica sobre o filme "Celebridade":

Eron Duarte Fagundes
Celebridade Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 29/01/2004

Celebridades (Celebrity; 1998), o filme de Woody Allen que chegou um pouco atrasado aos cinemas brasileiros e está disponível também em DVD para os adeptos da comodidade caseira em nova tecnologia, evoca em seu ritmo cinematográfico o estilo de filmar que celebrizou o italiano Federico Fellini: as seqüências são saltitantes, em sua busca de dar uma visão abrangente da sociedade nova-iorquina Allen faz sua câmara saltar inquieta e em certo sentido documentalmente. Mas, conquanto os tipos em cena pareçam extraídos duma fauna felliniana (mulheres sensuais, homens ridículos), a marcação cinematográfica de Allen se aproxima em algumas das encenações do francês Eric Rohmer: tênues movimentos de câmara que, em planos-seqüëncia, captam os intelectualizados diálogos das personagens.

Embora faça as citações devidas a seus mestres europeus (nada mais felliniano do que o humor daquela seqüência da chegada equivocada de obesos para uma tomada cinematográfica que exigia outra categoria de pessoas: a dos obesos era a do dia seguinte, alguém da produção se confundiu), o novo Allen é bastante pessoal em sua perversidade e na desabusada ironia com que tenta demolir o mito da celebridade em nossa sociedade atual. O repórter vivido por Keneth Branagh, imitando Allen em seu jeito de interpretar e falar, serve para que o realizador reflexione sobre o poder de criação de celebridades por parte da mídia no mundo de hoje.

Homem célebre, Woody Allen coloca-se com seu filme no centro do furacão. A personagem de Branagh é um romancista que vai tentar a sorte em roteiros de cinema; a rápida aparição de Leonardo DiCaprio como um jovem ator desgovernado emocionalmente que quebra o cenário de um quarto de hotel revela a habilidade de Allen em utilizar o astro de Titanic (alguém lembra que este filme de 1997 foi dirigido por James Cameron?) como exemplo do uso da celebridade. As crises sentimentais entre homens e mulheres vão abalar a estrutura íntima das personagens e do filme.

O vocábulo "socorro" que aparece nos céus de Nova Iorque no início e ao fim da fita é o rugido do indivíduo contra a massificação contemporânea. As perdições da Nova Iorque atual no cinema de Allen correspondem às perdições da Roma do começo dos anos 60 para o cinema de Federico Fellini.