Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 24/01/2011
Como ocorreria em Um lugar ao sol (1951), de George Stevens, em Tarde demais (The heiress; 1949), de William Wyler, aparece em cena o amor entre um homem pobre e uma mulher rica, tema recorrente em Hollywood, como se veria, pelos mesmos anos, em A valsa do imperador (1947), de Billy Wilder. Na realização de Wyler o astro Montgomery Clift interpreta outra vez um jovem pobre por quem uma garota rica vem a apaixonar-se; aqui trata-se duma abastada herdeira que entra em conflito com seu pai ao dar bandeira ao pretendente sem eira nem beira.
ExtraÃda duma das obras-primas do escritor Henry James, que teve uma versão da polonesa Agnieszka Holland em 1997, Tarde demais é brilhante em todas as suas cenas. Clift e sua parceira Olivida de Havilland estão impagáveis, assim como o velho Ralph Richardson. A cena final em que a herdeira recusa a nova investida do pretendente mostra todo o talento de Olivia para conferir malignidade e cálculo à sua personagem, que, como diz a frase final da obra de James, prefere bordar para toda a vida a aceitar as mentiras de um paquerador qualquer.
Como ocorreria na versão da diretora polonesa, Wyler altera um pouco (e até mais) o final do livro. No romance o reencontro dos ex-amantes revela o anacronismo temporal que se instala entre eles, com o homem aceitando a situação. “Perdoe-me a intrusão†diz ele a ela. Wyler transforma tudo: ela o engambela, deixando-o do lado de fora, a porta está trancada, ele bate desesperadamente, ela dentro bordando. O curioso é que, mesmo com esta alteração, o filme mantém o clima de defasagem amorosa que ficou entre os amantes: quando ele deita falação com as mentiras de sempre, e a expressão de Olivia revela a metamorfose da personagem, com algum plano sobressaindo, fica claro para o espectador o anacronismo da relação. Isto não ocorria no filme de Agniezska, que episodicamente altera até menos o texto do livro: o homem só sai cabisbaixo, inconformado. Este é um dos segredos da direção cinematográfica: o que se esconde por detrás da materialização fÃlmica para dar certos sentidos a uma pelÃcula. (Eron Fagundes)