Crítica sobre o filme "Há Tanto Tempo Que Te Amo":

Viviana Ferreira
Há Tanto Tempo Que Te Amo Por Viviana Ferreira
| Data: 28/10/2009

Numa determinada cena, numa discussão à mesa de Há tanto tempo que te amo (Il y a longtemps que je t’aime; 2008), filme francês que representa a estreia na direção do escritor e roteirista Philippe Claudel, um homem diz à personagem de Elsa Zylberstein, que vive uma irrequieta professora de literatura, que não entende como ela, mestra em letras, pode não gostar de Rohmer (Eric Rohmer, cineasta francês cujas ligações com a arte da palavra sempre se evidenciaram em seus filmes e em seu pensamento estético); outro homem observa que isto não significa que ela não entenda Rohmer, significa simplesmente que ela não gosta do cinema de Rohmer. A discussão sobre as abundantes características literárias do cinema de Rohmer, dividindo os espectadores entre os que se aborrecem com seu estilo de filmar e os que se encantam com as sutilezas que ele põe diante das câmaras, é antiga. Claudel transpõe esta questão cinematográfica para dentro de seu filme, tanto como tema-mote (a discussão à mesa entre personagens) quanto como estruturação formal de sua narrativa. O cineasta norte-americano Arthur Penn, numa sequência de Um lance no escuro (1975), fazia também de passagem uma altercação entre personagens sobre os filmes de Rohmer, alguém dizia em cena que Rohmer era muito aborrecido; gostando ou não do jeito rohmeriano, o que se concentra como importante é que o assunto se afigura perturbador para admiradores e detratores do realizador de O joelho de Claire (1970).

Em Há tanto tempo que te amo há um pouco de Rohmer, mas há muito de O silêncio (1962), do sueco Ingmar Bergman, embora Claudel não seja tão cruel e profundo quanto o diretor nórdico. Claudel semeia frequentemente relações intelectuais do cinema, referindo especialmente livros (figuras constantes na imagem e nos diálogos), embora, numa explosão contra os artifícios da arte (Dostoievski e os paralelos com a vida), a personagem da professora de literatura tente desbaratar este olhar a vida pela literatura, mas isto, pela maneira como o filme de fato se articula, é muito mais uma autocrítica do cineasta Claudel: que pode o cinema fazer diante da realidade da dor?

As relações obscuras e tensas entre duas irmãs que não se veem há muito tempo (uma delas passou quinze anos na prisão por assassinato) se desenvolve de maneira marcadamente surda ao longo da narrativa; com um dueto interpretativo exuberante entre a inglesa Kristin Scott Thomas (falando francês, embora a maior parte do filme ela se expresse com seus impressivos silêncios e sua implacável caracterização facial e de movimentos) e Elsa Sylberstein, além de coadjuvantes precisos e harmonizados entre si, Há tanto tempo que te amo só no seu final resvala para o melodrama (um pouco lacrimoso, mas bastante longe das impurezas hollywoodianas de A proposta, 2009, de Anne Fletcher) e para uma exposição objetiva do drama da protagonista, drama que até ali permanecia numa zona de sombras densa e sinuosa; praticamente em três quartas partes de sua narrativa, a realização de Claudel adota uma argúcia espiritual próxima dos labirintos psicológicos de Bergman, Rohmer ou Robert Bresson —daí por que a cena sobre Rohmer, à mesa, é fundamental, revelando ao mesmo tempo o fascínio e a rejeição que Claudel pode fazer ao pai Rohmer. (Eron Fagundes)

.

É incrível a habilidade de Phillipe Claudel na excelente direção de seu primeiro filme Há tanto tempo que te amo, protagonizado pelas sempre ótimas Kristin Scott Thomas e Elsa Zylberstein, onde ambas interpretam irmãs em um drama bem construído e forte.

Quando Juliete Fontaine (Thomas) sai da prisão aos cumprir 15 anos por assassinato, ela, com a ajuda de uma assistente social, reencontra a irmã mais nova Lea (Zylberstein) que é casada e tem 3 filhos, que convida Juliete para ir morar com ela. O filme mostra então a rejeição e sofrimento de uma ex presidiária, desde o medo do cunhado em relação à seus filhos, até as pessoas que vivem no local (o filme se passa em Lorraine, região situada na França). E, aos poucos, vamos conhecendo não só o motivo que levou Juliette à prisão, como o seu grande sofrimento, e, mais do que isso, sua solidão interminável.

O filme é uma jóia, onde Kristin Scott Thomas brilha, eternamente, em um papel que, não só é difícil por ser uma língua diferente da atriz (Kristin é britânica e fala em um francês perfeito no filme), mas também pela personalidade da personagem, muitas vezes inacessível e implícita. Zylberstein também não perde em sua atuação, e traz uma Lea que, embora ame sua irmã, tem de cuidar das inseguranças e da dificuldade de aproximação com a mesma.

Enfim, na minha opinião, ambas trazem papéis dignos de Oscar® (injustiça absoluta Kristin ter ficado fora do rol das indicadas deste ano), e Claudel, em um roteiro e direção magníficos, mostra grande aptidão para que, futuramente, ele nos traga novos grandes filmes.

Muito bom filme, que merece realmente uma locação. Mesmo se você não goste de filmes franceses, vale a pena pelas ótimas atuações, que são o ponto central do filme. (Viviana Ferreira)