Crtica sobre o filme "Simplesmente Feliz":

Rubens Ewald Filho
Simplesmente Feliz Por Rubens Ewald Filho
| Data: 07/07/2009
Existem aqueles filmes que, quando terminamos de ver, não só nos dão uma sensação boa, como também um aprendizado. Desde que Happy go Lucky estreiou no festival de Berlim, e Sally Hawkins venceu o leão de prata de melhor atriz, além da temática do filme, eu esperava ansiosamente vê-lo e analisá-lo. Pois bem, visto o filme, digo simplesmente que este é o filme mais doce do ano. Alegre, inteligente, singular e extremamente bem feito, Happy go Lucky vem em contrapartida dos usuais filmes de Mike Leigh, que retratam mais os dramas do dia-a-dia do que a felicidade casual.

A história é centrada em Poppy (Sally Hawkins), professora primária de 30 anos, alegre, divertida, que divide apartamento com sua melhor amiga também professora Zoe (Alexis Zegerman) e é uma pessoa imensamente feliz. Sim, pura e verdadeiramente feliz. Ela não mede esforços em querer que os outros também sejam felizes, e mesmo não sendo apaixonada por ninguém ela não reclama. Apenas vive, como na verdade todos nós devíamos viver. Ela diverte-se nas baladas, vai à feira, adora ensinar e interagir com seus alunos, sempre depois do trabalho vai pular em cama elástica para se desestressar e faz aula de flamenco. No meio de tudo isso, Poppy perde a sua bicicleta e decide tomar aulas de direção. É aí que ela conhece Scott (Eddie Marshan, maravilhoso no papel), seu novo professor de direção que se revela ser seu oposto: ele é mau- humorado, chato, pessimista e aparentemente infeliz. Implica com o jeito de Poppy, suas botas, suas piadas e seu jeito encantador. E é neste antagonismo maravilhoso, que Mike Leigh desenvolve sua idéia: diferentemente de longas como Amélie Poulain, onde a protagonista quer fazer outros felizes e não encontra resistência, Poppy encontra em Scott a sua verdadeira resistência, que é onde as pessoas, em sua rotina, perdem realmente a alegria de viver.

A lição do filme é totalmente simples, e muito clara: em vez de ficarmos reclamando das coisas que não temos, ou que gostaríamos de ser e não somos, deveríamos apenas viver a nossa vida, tendo orgulho do que realmente somos. É simples, é básico é singelo, mas é a pura verdade. Ao longo da trama, onde Poppy vai vivendo as aventuras e contratempos de sua vida, ela vai também conhecendo outras realidades, como a de seu aluninho de 7 anos agressivo, ou de um mendigo que ela encontra na rua. Mais do que isso, Poppy vai aprendendo mais, e também crescendo mais em si mesma. Falar mais do enredo é até covardia, pois este é um filme que realmente deve ser apreciado em todos os seus detalhes.

Em relação à parte técnica do filme só posso dizer que é excelente. Mike Leigh não só dirige muito bem como escreve muito bem este roteiro (aliás sua indicação ao Oscar de roteiro original foi realmente obrigatória). O figurino da sempre ótima Jacqueline Durran é uma graça: as roupas de Poppy são muito bem distribuídas (prestem atebnção nas meias rendadas coloridas, que são um charme), a fotografia de Dick Pope é graciosa ao extremo, a direção de arte de Patrick Rolfe e Denis Schnegg é excelente, e a trilha de Gary Yershon (de Topsy Turvy) é realmente de uma delicadeza profunda.

Quanto às atuações Eddie Marsan está ótimo, assim como todo o elenco secundário do longa (incluindo Alexis Zegerman e Samuel Roukin). Mas Sally Hawkins...Sally é luz, é dia, é sol, é emoção, é sorriso, compensação, é arranjo e poesia. Sua Poppy não é apenas radiante, ela é sublime. Independente de Sally não ter concorrido ao Oscar, desde já ela merece aplausos. Merece por ter feito a atuação mais original que eu vi desde a maluquinha Ashley de Amy Adams no independente Junebug, por ser segura, autêntica e certeira em seus atos. Sally, que já havia trabalhado com Leigh O segredo de Vera Drake, e em Agora ou Nunca, esteve presente na tão polêmica e aclamada série baseada no best-seller de Sarah Waters "Fingersmith", mas ganhou notoriedade no ano passado por protagonizar a versão para a tv de Persuasão baseado na obra de Jane Austen. Com certeza, haverá para Sally um "antes e depois" em sua carreira.

E "Emmarhah" pra vocês também. (Viviana Ferreira)

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Os admiradores do diretor Mike Leigh devem se preparar para conhecer um filme um pouco diferente. Embora tenha sido feito de sua maneira habitual, ou seja, ele improvisou o roteiro com seus atores durante seis meses, desta vez não fez um drama pesado como Segredos e Mentiras (“Secrets & Lies” - 1996) e O Segredo de Vera Drake (“Vera Drake” - 2004) ou um musical como Topsy-Turvy (1999). É mais uma comédia, um estudo de personagem, onde a história é menos importante do que a protagonista, seu comportamento, sua maneira de ser, suas características.

Um filme que revelou uma atriz - Sally Hawkins -, que já havia trabalhado com ele antes em Tudo ou Nada (All or Nothing - 2002) e Vera Drake, e participado de filmes como O Segredo de Cassandra (2007), de Woody Allen, Nem Tudo é o que Parece (2004) e O Despertar de uma Paixão (2006),  embora, mesmo depois deste filme, as pessoas ainda terão dificuldade de guardar sua fisionomia.

Sally foi a melhor atriz no Festival de Berlim, ganhou o Globo de Ouro de comédia, e melhor atriz pelos críticos de Nova York, Boston e National Society, dentre outros. Mas foi esquecida pelo Oscar. Injustamente. Porque é memorável sua criação de Poppy, uma garota que está sempre feliz, bem-humorada, alegre, ou seja, uma chata. Ela é uma professora numa escola do Norte de Londres, perpetuamente otimista e disposta, justamente a ponto de levar qualquer um à loucura. É difícil se ver um personagem desses no cinema, embora eu conheça alguns na vida real. Mas Leigh teve a sensibilidade de descobrir essa figura, e fazer com que Sally a interpretasse com verdade, sem cair nunca na caricatura. O filme não tem muito o que contar, mostra sua vida, tomando lições de flamenco, convivendo com as amigas, tentando  aprender a guiar com um mal-humorado professor - Eddie Marsan - que primeiro implica com ela, e depois sente-se atraído. Até se mostrar um lado mais profundo dela, quando tem que cuidar de um garoto com problemas.

O filme, embora seja o mais leve de Leigh, não deixa de ter momentos sérios e até profundos, que ele sabe resolver com talento. Mas, para mim, é um show de uma atriz muito especial, muito rara, que merecia maior reconhecimento. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 13 de abril de 2009)