Crítica sobre o filme "Coisas Que Perdemos Pelo Caminho":

Wally Soares
Coisas Que Perdemos Pelo Caminho Por Wally Soares
| Data: 27/05/2009

O cinema de Susanne Bier é melodrama. Depois do bom Brothers e do ótimo Depois do Casamento, a diretora sensível encara mais uma vez uma história de perdas, pecado e perdão. A forma como dirige, muitas vezes realista até, tende a cair para o melodrama (estranhamente). Mas, felizmente, Bier sabe orquestrá-lo para que não se torne muito exagerado ou até mesmo incômodo. Mas ao contrário do que fez em seu trabalho anterior, Depois do Casamento, Bier perde um pouco o foco neste seu novo filme, que marca sua estréia no cinema de Hollywood. Coisas que Perdemos pelo Caminho é um belo filme, de personagens fortes e muitas vezes comovente, mas é visível o desleixo de momentos, principalmente da direção. Inclusive um roteiro que, soando em vezes incompleto e não convencendo, acaba por se arrastar diversamente.

Mas o filme funciona, independente dos erros. Como, por exemplo, os cortes abruptos e mal feitos, em uma tentativa fracassada de alcançar um estilo mais original e vibrante. Além disso, a trilha sonora do filme, entre outros aspectos da estética, me remeteram demais à 21 Gramas. Me via pensando constantemente no filme de Iñarrítu, que ainda contava com Benicio Del Toro, e isso com certeza não é positivo. O forte do filme está, portanto, nos personagens, na sensibilidade com o qual é dirigido e, claro, nas atuações excelentes. Dentre alguns momentos inspirados, podemos facilmente nos identificar com os personagens e nos comover ao lado deles, sentir por eles até. Bier felizmente consegue isso. Pena que ela deixa essa sua habilidade de lado algumas vezes para se concentrar em outro drama, no que ocorre em volta dos personagens ao invés do que por dentro deles. E por isso, para cada momento inspirado, existe um irregular.

Seria ignorância da minha parte, porém, não identificar a melhor coisa deste filme. E esse elemento tem que ser Benicio Del Toro. Em uma de suas mais esmagadoras e profundas performances, ele arrebenta e demonstra o quanto é um ator soberbo. Uma pena ter sido esquecido nas premiações. Ele consegue, por tanto, deixar Halle Berry bem apagadinha. Berry faz bem, consegue trazer essência a personagem, mas falta intensidade. E por isso, Del Toro rouba todos os momentos divididos entre eles – muitos. Formam um par ótimo. Deixam alguns momentos que seriam secos reluzentes e chamativos. Bier parece ter outro estilo inconfundível também, além do melodrama: dos olhares. Todos os seus filmes – pelo menos os que vi – ela constantemente foca nos olhares de seus personagens. E eu adoro isso. Traz honestidade e crueza à história. E isto muitas vezes acontece aqui. Enriquece o resultado final, quase que condensando seus defeitos.

O filme te vence pela mensagem, carregada pelos sentimentos de seus personagens queridos e oprimidos. O que pode debilitar o filme às vezes é a dosagem além do esperado de melodrama, o que acabou incomodando. Mas na sua natureza é um belo e virtuoso filme. Além de focar a vulnerabilidade do ser humano e seu constante desejo de ser reconhecido, refletindo seu medo de isolamento, o filme não só retrata o quanto podemos perder com tragédias, o quanto o fogo destas pode apagar na nossa vida, mas também fala sobre o que ganhamos. Sobre as coisas que podemos ganhar ao perder. Virtudes, moralidade, visões e consciência. Apesar de muitas vezes previsível, o filme funciona. O desfecho então, que contava com alguns clichês básicos, funcionou maravilhosamente. Ou pela sensibilidade, ou pelos personagens, ou pela energia do elenco. De qualquer forma, e ainda que bem falho, este é um belo filme em seus próprios termos. Falho, mas com algo a dizer, e consegue dizer isso de uma forma poética que emociona. No fim das contas, o filme perde e ganha, e o espectador também.