Crítica sobre o filme "Elvira Madigan":

Viviana Ferreira
Elvira Madigan Por Viviana Ferreira
| Data: 21/01/2009
Excetuando-se a obra de Ingmar Bergman, o cinema sueco é praticamente desconhecido no Brasil. Bo Widerberg (1930-1997) é um dos raros realizadores suecos que em determinada época chegou a gozar de prestígio internacional. Foi quando rodou Elvira Madigan (1967), até hoje seu filme mais conhecido e amado.

O sentido trágico da paixão é o que interessa ao olho clínico do cineasta em Elvira Madigan. No derradeiro trabalho do diretor, Todas as coisas são belas (1995), e que teve distribuição comercial no Brasil, a tragédia da paixão era radiografada com idênticos rigor formal e sensibilidade ao debruçar-se sobre o esquentamento e a decadência dum caso de amor entre um adolescente e uma mulher casada madurona. Elvira Madigan empurra a paixão para seu verdadeiro habitat, a margem da sociedade: a trapezista de circo Elvira e seu amante o tenente Sixten caem fora do convívio social e vão viver seu amor louco nas florestas da Dinamarca até o esgotamento das reservas econômicas quando a fome aperta e eles decidem suicidar-se; ela abandona seus colegas de circo, ele deixa a família e torna-se um desertor do exército, Wiberberg filma com absoluta beleza e densidade este amor desesperançado e, como todo amor autêntico, marginal.

Nordicamente, Widerberg, em sua visão das relações amorosas entre os seres humanos, foge tanto ao edulcorado hollywoodiano quanto ao cartesianismo francês. É tudo muito seco e distanciado, embora a paixão contida na epiderme dos atores Pia Degemark e Thommy Berggen transborde do celulóide e chegue ao coração do observador. A fotografia é um dos luxos desta realização e a cópia restaurada pela Versátil presta justiça a suas sutilezas plásticas. Lembro que quando vi este filme de Widerberg nos anos 80, no cinema Bristol, dispúnhamos duma cópia contratipada, que diminuía bastante a tensão plástica da narrativa. (Eron Fagundes)

.

Pequenos gestos são sempre especiais. Mesmo que precedam grandes tragédias ou ações desenfreadas, nada é mais mágico em uma historia que a alusão as pequenas coisas, que podem enriquecer qualquer enredo. Em um longa onde gestos valem mais do que mil palavras, Elvira Madigan é um clássico absoluto e inesquecível. Dirigido por Bo Widerberg, diretor suíço que tinha um jeito único de expor seus pensamentos, este pequeno grande clássico soa como uma perfeita opera onde o resultado final são sucessões de cenas brilhantes, suaves, e trágicas. Quando Hedvig, mais conhecida como Elvira Madigan, foge com Lorde Sparre, que larga sua família, o exercito e posição pelo amor da equilibrista, ambos sentem-se felizes e realizados...caminhos por campos ensolarados, dividem os beijos de verão, caçam borboletas, repartem queijos, beijos e vinhos...mas como nada é feito de sol e lua, o dinheiro acaba, Hedvig e Sparre tem de fugir novamente e o que era feito de sonhos, transforma-se em um melancólico pesadelo que é mais agravado pela chegada de um amigo de Sparre que quer traze-lo de volta.

Com esta premissa, a tragédia se sobrepõe à beleza dos olhos de Pia Degermark (que por uma ironia do destino teve uma vida tão trágica quanto sua personagem), e a fotografia incessante de Jorgen Persson, que irradia as cenas sobrepostas à tela. A trilha, que é feita mais por musica não original de Mozart e Israel Kolmodin, anuncia os movimentos lentos, pacientes, e contínuos de uma mulher desesperada, pelo amor, dor e fraqueza que um homem lhe causou. Outro trunfo do filme é o roteiro, com diálogos rastejantes onde Bo Widerberg mais uma vez mostra seu talento. Em uma das cenas chave do filme, Kristopher pergunta à Hedvig o que a fez escolher o Lorde. Ela, dentro de sua serenidade responde simplesmente porque ele é o melhor de todos, em uma cena que, através dos olhares descobre-se toda paixão e perda que envolvem os personagens. Digo então que o filme é isto, uma celebração belíssima da arte de se fazer cinema, e da arte de se ver um filme totalmente bem feito, onde os gestos mais uma vez dominam, suspirando e criando paradoxos da existência. (Viviana Ferreira)