Crítica sobre o filme "Enigma de Outro Mundo":

Jorge Saldanha
Enigma de Outro Mundo Por Jorge Saldanha
| Data: 19/01/2009
John Carpenter, da leva de cineastas que, a partir do final dos anos 1960, surgiram para se dedicar ao gênero fantástico, é o meu preferido. A partir de seu sucesso com o horror Halloween (1978), o cineasta realizou grandes filmes que iam do suspense fantástico (A Bruma Assassina, 1980) à aventura futurista (Fuga de Nova York, 1981). Tendo iniciado como diretor independente, sua oportunidade para trabalhar em um grande estúdio surgiu quando a Universal convidou-o para dirigir a refilmagem de O Monstro do Ãrtico (The Thing, 1951). Carpenter não titubeou em aceitar a oferta, até porque o filme original é um dos seus prediletos. Assim, ele convidou para o papel principal o ator Kurt Russel, com quem já trabalhara em Fuga de Nova York, arregimentou uma equipe de grandes talentos e realizou este O Enigma de Outro Mundo.

Em 1982, quando de seu lançamento nos cinemas, o filme foi injustamente classificado pela crítica americana, então empolgada com o bonzinho E.T. de Steven Spielberg (que estreara duas semanas antes), como uma cópia inferior e mais violenta de Alien. O publico também não correspondeu nas bilheterias, mas no exterior o filme encontrou admiradores, sendo posteriormente redescoberto pelos americanos na TV e em vídeo. Hoje, The Thing é considerado um dos melhores filmes do gênero e o ponto mais alto na carreira do cultuado diretor, que graças a um roteiro conciso e aos espetaculares efeitos de maquiagem criados por Rob Bottin, é bem mais fiel ao conceito imaginado pelo escritor John W. Campbell Jr. no seu conto "Who Goes There", no qual se baseara o longa original.

Indiscutivelmente The Thing não pode ser considerado um filme para estômagos fracos, graças às cenas onde vemos on camera (não esqueça que, na época, inexistiam efeitos em computação gráfica) a criatura absorver suas vítimas e, gradualmente, assumir formas deformadas e monstruosas de cães e seres humanos. Mas engana-se quem achar que Carpenter baseia a eficácia de seu filme apenas nisso. Aqui ele mostra que sabe construir, de modo lento e muitas vezes exasperante, uma claustrofóbica trama de suspense e horror. Outro fator de apoio importantíssimo é a memorável trilha original do lendário maestro Ennio Morricone, que usa timbres de sintetizadores que remetem não apenas às composições que o próprio Carpenter criou para seus filmes anteriores, mas também à antológica de Goblin para Zombie – O Despertar dos Mortos (1979), de George Romero. O score, principalmente em seu tema principal, apresenta ritmos pulsantes, graves e lentos, transmitindo ao ouvinte um senso de iminente ameaça. Também emprega cordas agudas para, em determinados momentos, acentuar o suspense ou simplesmente criar um caos orquestral.

Da memorável seqüência de abertura ao som da música hipnótica de Morricone, onde vemos um cão percorrer a vasta planície nevada perseguido por um helicóptero, passando pelo memorável desempenho "Clint Eastwood" de Kurt Russell, as cenas claustrofóbicas e as apavorantes encarnações do monstro, O Enigma de Outro Mundo é um filme de exceção – do tipo que, no gênero, há muito tempo não se faz. E dificilmente a prequel que está em planejamento na Universal, com roteiro de Ronald D. Moore (Battlestar Galactica), estará à sua altura.