Crítica sobre o filme "Dinheiro, O":

Eron Duarte Fagundes
Dinheiro, O Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 13/09/2008
A sintaxe bressoniana de filmar exala secura em cada quadro elaborado e mais ainda na justaposição de um quadro a outro quadro pela montagem: estaticidade e fixidez não transformam os filmes de Bresson em entidades mortas, antes são contemplações espirituais que palpitam esteticamente. Nascido na França em 1901 ou 1907 e falecido em Paris em 1999, o cineasta francês Robert Bresson rodou seu derradeiro trabalho, O dinheiro (L’argent) em 1983; e a força e a constância de sua obra podem ser ali detectadas.

Extraído dum conto do escritor russo Leon Tolstoi, O dinheiro retoma o tema da corrupção moral do homem, visto em obras-primas como As damas do bosque de Bolonha (a história de um artifício feminino prostituído; 1944) e Pickpocket (1959; um ladrão de carteiras resgatado idealisticamente pelo amor de uma mulher). Mais diretamente, a trajetória do protagonista de O dinheiro topa parentesco com a do jovem de Pickpocket; a personagem do último filme de Bresson é um adolescente que no início do filme se vê envolvido com falsificação de dinheiro, vai parar na prisão e no fim do filme, acolhido por uma senhora, vem a matar toda a família que cerca e coabita com esta trabalhadeira mulher; a discussão moral de Bresson é sempre a validade do crime, a mancha deixada no ser, ou coisa que o valha. Neste aspecto, Bresson é mais dostoievskiano que tolstoiano; à ficção de Dostoievski o cineasta Bresson visitou em dois de seus filmes, Uma mulher suave (1969) e Quatro noites de um sonhador (1971).

O dinheiro exemplifica ainda e sempre aquilo que Bresson diz em seu livro Notas sobre o cinematógrafo (1975; edição brasileira da Iluminuras, com tradução de Evaldo Mocarzel e Brigitte Riberolle): “Filme de cinematógrafo em que as imagens, como as palavras do dicionário, somente têm força e valor pela sua posição e relação.†Um exemplo: os extraordinários planos da chacina final, narrada em elipses e algumas imagens indutivamente precisas, sem aquela nitidez óbvia que tanto repugnava ao genial diretor francês. (Eron Fagundes)