Ao contrário do que inicialmente dá a entender o nome nacional óbvio e simplista, essa produção romântica americana é, na verdade, bem aversa e particular, indo contra em sua estrutura e seus detalhes os grandes tiques hollywoodianos demasiadamente empregados ao gênero cansado. Entretanto, é fácil perceber que é pura roupagem nova, apenas inserindo uma maior introspecção de personagens e uma maior ousadia visual. Os elementos que tanto nos acostumamos a ver estão todos lá, apenas disfarçados. Desde os clichês habituais de casal que inicialmente não se compreende até um entender o outro até o fim previsÃvel, com direito à fuga de um ex-namorado exigente, o longa é sim averso em seu tom, seu estilo e até mesmo nas atitudes de seus personagens. No fundo, porém, é aquela coisa batida. Vale notar, por isso, o quanto a direção criativa do estreante Justin Theroux tenha sido primordial ao desenvolvimento do filme em si que, mais vÃvido e fugindo do lugar comum ao menos nos excessos, se tornou mais gratificante.
A câmera de Theroux é ótima. Em detalhes, pode até cair no vistoso e no desnecessário, mas em suma, o estreante cineasta tem um jeito com a câmera interessante. Algo que percebemos desde a cena inicial dentro de um cinema pornô até a saÃda dos personagens dele, com muita força de condução e envolvimento com a audiência. Theroux tanto nos repele do filme, com uma habitual irregularidade por parte de suas cenas criativas que em vezes saem do rumo, quanto nos atrai, sendo o foco o charme que tanto permeia a sessão, mais intensamente nos momentos finais. O filme em si é dotado de uma estranheza que achei virtuosa. Mesmo em que em vezes o resultado de tais bizarrices tenham sido irregulares, na maioria das vezes nos encantamos com todo o clima proposto e a espirituosidade suntuosa dos personagens, sempre interessantes, únicos e, traindo a natureza inicial do roteiro em unir elementos batidos, originais. Deve ser o grande diferencial do filme. Mesmo que as intenções de seus personagens sejam previsÃveis diversamente, a natureza por eles apresentada durante a projeção foge do que poderÃamos esperar e nos atinge com toques de naturalidade e improvisação refrescantes.
Nesse meio, encontramos no protagonista o aspecto mais atÃpico de todo o filme. Billy Crudup personifica, com grande desenvoltura e talento, um personagem averso extremamente chato de inÃcio que te faz questionar seriamente até que ponto estava assistindo uma comédia romântica. Alias, é interessante o filme brincar com seus próprios defeitos, estereótipos e clichês, vendo em Henry (Crudup) um ser averso a todos os fatores mais tÃpicos e usuais da sociedade, de andar de carro a dizer eu te amo. O filme faz uma visão bem humorada sobre o que é exatamente um estereotÃpico e, apesar de Henry incomodar imensamente ao inÃcio com seu tremendo mal humor e arrogância, serve como uma bóia no meio do oceano quando pensávamos estar afundando em previsibilidade. E a ilustre Lucy surge, com uma atuação tocante e sincera de Mandy Moore, que a cada filme que passa mostra maiores melhorias em demonstrar emoções mais genuÃnas. Lucy e Henry são antagônicos e com Crudup e Moore é o mesmo. A falta de quÃmica entre ambos é fatal e, mesmo no último ato, quando todo o clima romântico martela na nossa cabeça, é um pouco difÃcil sentir pelos dois atores em especial que, mesmo competentes dentro de seus respectivos papéis, não conseguem ir muito além a construir um clima mais autêntico entre si.
Mesmo assim, Theroux teve sensibilidade o suficiente para construir um último ato contundente, ainda que não de todo contagiante. A cena final é previsÃvel e de uma simplicidade tremenda, mas, desde a forma como é filmada até a intimidade dos diálogos, nos deixa mais próximos dos personagens e, por isso, nossa afeição pelo filme em si e seu impulso romântico até então transparente começa a nascer. "Uma História de Amor" é um exercÃcio dignificado em cinema, de um cineasta promissor cujos aparatos visuais trazem algo a mais ao filme ao mesmo tempo em que algo a menos. Com maior equilÃbrio Theroux atinge os aplausos. Já o roteiro de David Bromberg possui muitos diálogos ótimos e alguns personagens interessantes, mas, como já citado, se disfarça quando é, na verdade, cheio de déjà vus e temas batidos. O elenco, por sua vez, enaltece o quanto pode, lembrando também a participação valiosa do sempre competente Tom Wilkinson. E, por menos que Crudup e Moore não combinem, vale notar que ambos (principalmente ele) são bons atores e realizaram sÃnteses admiráveis de seus personagens dignos. Recomendado, é um romance diferente, mas igual, inspirado, mas frÃgido, criativo, mas batido. Tentem ignorar os contras e se deixem levar pelo lirismo da belÃssima trilha, em casamento genuÃno ao visual e aos personagens.
(Wally Soares – confira o blog Cine Vita)