Crítica sobre o filme "Nação Fast Food":

Eron Duarte Fagundes
Nação Fast Food Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 19/12/2007
Aquilo que aparece estereotipado e sensacionalista no documentário Super Size — a dieta do palhaço (2004), de Morgan Spurlock, ganha uma audácia e uma análise multifacetada da desumanidade do lucro na sociedade americana em Nação fast food (Fast food nation; 2006), o mais recente filme realizado pelo sensível cineasta norte-americano Richard Linklater. Partindo do universo ganancioso duma rede alimentícia americana ao modo da famosa e multinacional MacDonald’s, Linklater investiga todos os canais da cadeia de produção alimentar, revelando com uma lucidez às vezes espantosa a podridão que se esconde nas relações de consumo e trabalhistas para além do fato aparente —uma carne com esterco encontrada na preparação de um sanduíche largamente consumido.

Linklater põe sua câmara nos campos onde se criam os animais para depois abatê-los e despejar celeremente na produção apressada de lanches populares. A convocação de paupérrima mão-de-obra terceiromundista é observada com senso humanista por Linklater; os mexicanos trabalhadores são vistos com uma decência que surpreende num filme comercial americano, especialmente quando pensamos no enviesado racismo da personagem de Tommy Lee Jones em No vale das sombras (2007), de Paul Haggis (“Malditos mexicanos!†exclama a certa altura Lee Jones, reclamando especialmente dos traficantes latinos que drogam os “ingênuos†jovens americanos).

A câmara de Linklater vê também as cruas relações de trabalho dentro do sistema de produção da loja alimentar. Linklater está igualmente observando os jovens que protestam contra o artificialismo e a crueldade do lucro das grandes empresas. E o executivo contratado para investigar o lapso tem um encontro exemplar e educativo com o magnata da rede vivido com delicioso cinismo por Bruce Willis (não me lembra ter apreciado tanto Willis, um simpático canastrão, quanto nos breves instantes em que aparece neste filme).

Nação fast food não chega a ser tudo o que promete porque Linklater ainda permanece um tanto quanto medroso em ousar formal e tematicamente. O homem duplo (2005), um belo filme mas certamente super-estimado por certos de cinéfilos, dava as possibilidades das audácias e dos limites do realizador. (Eron Fagundes)