Lamento não ter escrito antes sobre esta comédia – dramática que foi injustiçada nos Oscar (que a ignorou) e que também não fez sucesso nos cinemas americanos (depois de um inicio promissor acabou fracassando). O máximo que conseguiu foi uma indicação para seu astro Will Ferrell (melhor ator de comédia no Globo de Ouro) que veio do Saturday Night Live e que ainda não pegou no Brasil, onde suas fitas tem saÃdo diretamente em Home VÃdeo. Ele tem um estilo cara de pau muito particular que para apreciar é preciso conhecer melhor. O roteiro do novato Zach Helm adota a linha dos trabalhos de Charlie Kauffman , ou seja é um exercÃcio em meta linguagem, brincando com a narrativa e o espectador. Tudo muito bem conduzido por Marc Forster (Bem Vindo a Terra do Nunca).
Deixa eu tentar explicar porque curti tanto o filme. Uma das coisas que parecem estranhas em certas fitas é a chamada narrativa em voz off , ou seja, uma voz que se ouve (não se vê a pessoa) como se fosse o pensamento de alguém que em geral conta a historia, interferindo e comentando a trama , por vezes de forma literária, mesmo pedante (claro que existe uma diferença entre linguagem escrita e falada que alguns autores costumam esquecer). O filme conta a historia de um sujeito comum, fiscal do Imposto de Renda (que nos EUA é a coisa mais rigorosa que existe) que vai levando sua vida medÃocre e sem graça, até o dia em que começa a ouvir uma voz estranha que analisa e comenta e até prevê como é seu dia e sua vida . Fica muito espantado procurando uma psiquiatra mas não demora para perceber que há alguém contando sua historia, sua vida como se fosse um livro e que segunda essa voz, ele vai morrer em breve.
Isso o leva ao pânico enquanto nos estamos sabendo que a voz pertence a uma escritora de sucesso que esta tendo dificuldade com seu novo livro que conta justamente a vida daquele sujeito tão comum e sem graça. Um papel feito com a competência habitual por Emma Thompson. Tão difÃcil que a editora manda uma editora para acompanhá-la e ajuda-la (e vigia-la) o tempo todo (feita por Queen Latifah ).
Mas o engraçado é você ver o herói, chamado de Harold Crick, lutando para entender o que esta acontecendo e depois lutando para que não morra assim conforme a escritora planejou. Há também um romance encantador entre ele e uma vendedora de pães que não acredita em pagar impostos (Maggie Gyllenhaal). E finalmente a participação de um intelectual professor especialista na obra da escritora a quem ele recorre pedindo ajuda (o papel ganha maiores dimensões porque é feito por Dustin Hoffman). Aliás o filme ganha nova dimensão pela participação de atores importantes com Linda Hunt, Tom Hulce (de Amadeus, voltando ao cinema depois de anos), a estrela da Broadway Kristin Chenowith.
A verdade é que depois deste filme vou ter dificuldades de assistir um outro que use o mesmo recurso de narração só que a sério! Admito que seu gimmick (truque) de roteiro possa não agradar a todos (um amigo achou que faltava algo ao filme sem saber explicar o que). Mas achei um dos filmes mais inteligentes do ano. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 17 de fevereiro de 2007)