Não há dúvida que Emilio Estevez é um sujeito muito popular, querido por seus amigos. Para seu retorno à direção, depois de alguns anos de afastamento, ele foi capaz de reunir um elenco impressionante, de gente famosa, inclusive sua ex-mulher Demi Moore (e o atual marido dela, Ashton Kutcher), que inclusive aparece cantando. Por causa deles, o filme teve até certo prestígio, tendo sido indicado aos Globo de Ouro de Melhor Drama e Canção (‘Never Gonna Break my Faith‘, de Bryan Adams), embora toda a crítica tenha sido negativa.
Acontece que este é um projeto pessoal, obviamente empenhado, de Emilio (o pai dele, Martin Sheen, também está presente). Além de prestar uma homenagem a Robert Kennedy, irmão de John Kennedy, reconstituindo como ele foi assassinado (que estava para ser demolido, e foi parcialmente aproveitado nas filmagens), num evento ao qual estava presente o pai dele (Emilio se lembra do candidato à presidência, e daquela noite fatal). Embora muita gente se lembre da noite de 5 de junho de 1968, quando Robert Kennedy (1925-68) foi assassinado a tiros, no Hotel Ambassador em Los Angeles, pouco se falou sobre esse tiroteio ter atingido outras pessoas, cerca de 22, cujas vidas nunca mais seriam as mesmas; o filme se propõe a contar isso: como essas vidas se cruzam no hotel (Kennedy aparece em documentários antigos, inclusive ouvimos seu último discurso). Seu assassino, Shirhan Sirhan, um emigrante jordaniano de 24 anos, foi condenado à câmera de gás em 1969, mas até hoje não foi executado. Diante das conseqüências da eleição de Bush e a decadência da política americana, é compreensível a nostalgia por líderes antigos, carismáticos e lendários como ele.
O filme acaba sendo um lamento por justiça, visto pelos olhos dos hóspedes e empregados do hotel. Pena que nunca consiga uma coesão: os vários personagens entram e saem, quase todos sem deixar maior marca, alguns com nomes modificados, poucos especialmente interessantes. Talvez você guarde o gerente (o ótimo William H. Macy), a cabeleireira (Sharon Stone se esforça em fazer um tipo cafona, desmistificando-se), ou o novo astro, Shia LeBoeuf (estourando agora, com ‘Transformers‘).
Escrito pelo próprio Emilio, rodado praticamente todo com câmera na mão, o filme serve ao menos para informar e relembrar uma geração, que desconhece os fatos.
Que esse ‘all star cast’ sirva, ao menos, para atrair maior público. (Rubens Ewald Filho na coluna clássicos de 30 de julho de 2007)
.O diretor de cinema Emilio Estevez se esforça muito para estabelecer o retrato cinematográfico de uma época em Bobby (2006), filme que, cruzando as vidas de diversas personagens, busca uma costura nos passos finais do estadista americano Robert Kennedy quando tudo indicava que seria o futuro presidente e tenta um clímax no brutal assassinato de Bobby ao fim da narrativa, imagens regadas a sangue e a um discurso utópico e pacifista (bem de acordo com os revolucionários e esperançosos anos 60). A voz de Bobby no fim do filme, traçando uma senda de ação política visionária que, diante do cadáver do político, parece uma ação derrotada momentaneamente mas sempre apontando para um futuro, esta voz contém toda a emoção de uma época, especialmente para quem —criança, moço, madurão ou velho— viveu aqueles anos; mas ocorre que Estevez tem mão dura para manejar um roteiro tentacular e fica preso a regrinhas convencionais de filmar, realizando um projeto sem ousadia, sem sangue, bastante abaixo da energia utópica de sua personagem, um dos grandes homens de seu tempo e, sabe-se pela peroração final, um cérebro ainda hoje muito adiante daquilo que a humanidade pode apresentar.
O filme entremostra contundentemente suas debilidades, apesar de toda a nossa nostalgia. Os relacionamentos que Estevez desenha se abeiram muitas vezes de melodramas insossos, mármores novelescos sem inspiração. O cineasta exibe toda a sua miopia artística. É uma pena. Bobby Kennedy merecia um filme mais denso, menos interessado em expor comercialmente seu tema (às vezes se aproxima de um documentário demagógico e sensacionalista). O curioso é que Estevez contou com um bom elenco: Anthony Hopkins, que é também produtor executivo; a reaparição de Demi Moore como uma diva dos anos 60, e aí Demi aciona com extrema sedução um estrelismo estudado, agudo; Helen Hunt, Sharon Stone, maduronas sempre bem-vindas. Ninguém falha entre os intérpretes. O problema é a cabeça que os dirige.
No rol de referências de época semeadas por Estevez, surgem as citações em diálogos a Bonny e Clyde (1967), de Arthur Penn, e a A primeira noite de um homem (1967), de Mike Nichols, dois filmes emblemáticos do cinema americano nos anos 60 e cujo sopro libertário em Hollywood (violento e sinuoso em Penn, cordato e clássico em Nichols) poderia fechar com o retrato duma época que permitiu a existência de um indivíduo como Robert Kennedy. Mas, assim como se insere na narrativa, as duas reverências cinematográficas de Estevez soam forçadas e pedantes. (Eron Fagundes)