Crítica sobre o filme "Two and a Half Men: 1ª Temp.":

Fernanda Furquim
Two and a Half Men: 1ª Temp. Por Fernanda Furquim
| Data: 30/09/2007
A sitcom tradicional é um gênero que foi explorado pela TV Americana para controlar o senso de humor dos comediantes que apresentavam-se em shows ao vivo de variedades, os chamados “vaudeoâ€. Com piadas consideradas impróprias, os comediantes estavam tendo problemas com a censura dos patrocinadores e com os bons costumes da época. Assim, ao investirem em comédias que visavam o público feminino e seu universo, garantia-se um humor mais apropriado para o público familiar.

Desta forma, a sitcom tradicional se desenvolveu, visando, principalmente, as mulheres e seus problemas. Mesmo quando o personagem masculino era o principal, ele estava cercado de mulheres que lhe orientavam ou que influenciavam seu comportamento. Ao longo dos anos, surgiram sitcoms tradicionais que exploraram o universo masculino, como “Os Amores de Dobie Gillisâ€, nos anos 60, sobre um jovem adolescente que está descobrindo o sexo oposto. Outras viriam, mas sempre em menor número em relação às mulheres ou às questões familiares. “Two and a Half Men†resgata essa abordagem, ao expôr as dúvidas, os medos, as obsessões, as inseguranças, os relacionamentos e as preocupações do homem moderno. Embora ainda esteja cercado por mulheres.

A série é uma versão moderna de “Um Estranho Casal/The Odd Coupleâ€, que teve como base um filme, que por sua vez teve como base uma peça de Neil Simon; na qual vemos novamente a relação entre dois homens com interesses e estilos de vida completamente opostos. Na série de 1970 a 1975, temos Oscar (Jack Klugman), um jornalista esportivo, que adora jogo, mulheres e bebida. Completamente desleixado e sem interesse nos problemas do dia-a-dia, ele passa a dividir seu apartamento com seu amigo, Felix (Tony Randall), um fotógrafo extremamente organizado, maníaco por limpeza e amante de músicas clássicas. Sua esposa o expulsou de casa. Sem ter para onde ir, Felix vai morar com Oscar e aí começam os problemas que irão testar a amizade dos dois. Questões como encontros casuais, bebedeiras, brigas, jogos, saúde, trabalho, eram abordadas pela série.

Mas, “Two and a Half Men†vai além no desenvolvimento dos personagens, na abordagem ao universo masculino e na forma como eles vêem a vida. O ingrediente que promove essa abordagem e que difere de “Um Estranho Casalâ€, é a presença de Jake, o filho de Alan. Ele é o personagem responsável por várias situações presentes e deverá ser ele que irá, no futuro, determinar o rumo e a relação dos personagens adultos quando Jake entrar na adolescência. Com a presença de Jake, a série traz para as histórias a participação da ex-esposa de Alan, Judith (Marin Hinkle), e, também, as visitas da avó, Evelyn (Holland Taylor). Somadas à presença de Berta (Conchata Ferrell), a empregada, temos um elenco de mulheres cercando o universo masculino de Charlie e Alan, cobrando dos dois posturas e atitudes, especialmente em relação à educação de Jake, tal qual a tradição das sitcoms.

A participação de Jake no enredo parece ter sido inspirada no filme “Um Grande Garoto/About a Boyâ€, de 2002. Assim, com os ingredientes de duas produções, temos uma terceira, que poderia facilmente “morrer na praiaâ€, mas, graças a ótimos diálogos e situações inspiradas nas personalidades dos pesonagens, o resultado é justamente o oposto.

Muitos acreditam que para escrever um roteiro é preciso começar com a piada. Até o público quando vai assistir a uma comédia, fica esperando pela parte engraçada da história. O telespectador cobra a risada e, por isso, muitos roteiros são um desastre, já que a cena engraçada não deveria ser o ponto de partida da situação ou da história. Tal qual os atores em suas interpretações, os roteiristas precisam escrever de dentro para fora e não de fora para dentro. “Two and a Half Men†é uma sitcom que trabalha o texto dessa forma. São as questões internas dos personagens que movem a ação e determinam o diálogo. Não se trata de uma produção memorável ou uma das melhores séries de todos os tempos, mas “Two and a Half Men†traz um bom desenvolvimento de situações, personagens e um ótimo elenco.

Charlie (Charlie Sheen) é o clássico solteirão que adora sua vida. Ele tem medo de compromissos e, com isso, não tem namorada ou trabalho que o mantenha preso horas a fio. Ele compõe jingles para comerciais com os quais ganha uma fortuna. De boa aparência, não precisa fazer muito esforço para conseguir encontros casuais. E são casuais mesmo, se puder ele nem pergunta o nome. Quanto menos souber, melhor. Qualquer sinal que possa fazer da moça sua amiga ou mesmo alguém conhecida, já o assusta. Charlie conquistou uma fã obsessiva, que o visita diariamente, mexe em suas coisas e sabe tudo a seu respeito. Determinada a tê-lo de volta, Rose (Melanie Linskey) tenta vários truques, mas nenhum funciona. Ela então acaba sendo o pau-para-toda-obra de Charlie e Alan, sempre que os dois precisam urgente de ajuda ou de uma babá para Jake.

O estilo de vida de Charlie é o resultado da relação que ele tinha com a mãe, Evelyn (Holland Taylor), agente imobiliária que não se importa muito com os filhos. Preocupada com a aparência e seu estilo de vida, Evelyn assume a atitude da mulher que já criou seus filhos, ou seja, já fez seu dever, agora quer viver sua vida como bem entender. Não se aperta com as preocupações, comportamentos ou acusações dos filhos. Nessas horas, uma chantagem emocional resolve a questão.

Alan também é fruto da relação com mãe. Inseguro, metódico, responsável, até demais, não se conforma com o fim do casamento. Mesmo quando a esposa diz a ele que é lésbica, ele ainda acredita que poderá ter sua família de volta. Aos poucos, os dois irmãos percebem que suas vidas mudaram para sempre. Alan precisa aprender a se soltar e, Charlie, a assumir compromissos, nem que sejam apenas com relação a Jake, seu sobrinho que vê nele a imagem do que gostaria de ser quando crescer. Mas, mesmo admirando o tio, Jake não se torna cego para seus defeitos.

A 1ª Temporada se desenvolve em um crescendo de situações e estado emocional dos dois irmãos. Inicia com o choque da mudança de vida de ambos, passando pelas tentativas de Alan em se reconciliar com Judith; a “conquista do terreno†na qual Alan, Charlie, Jake e a empregada Berta, estabelecem regras e limites; a reação à nova situação que leva Charlie a convencer o irmão a buscar novos relacionamentos; a conscientização de Alan que ele está de volta à vida de solteiro; o início da amizade entre Charlie e Jake, com a qual o tio terá que aprender com o sobrinho; culminando na preocupação dos pais divorciados com a educação e o comportamento do filho. Destaques para os episódios “Hey, I Can Pee Outside in the Darkâ€, no qual todos ficam preocupados com a mudança de humor de Jake e cada um tenta resolver seu problema, chegando ao ponto de levá-lo a um psicólogo onde todos passam por uma sessão de terapia. “Just Like Buffaloâ€, que apresenta a preocupação de Judith com a influência de Charlie sobre o comportamento de seu filho. “An Old Flame With a New Wickâ€, no qual Charlie reencontra uma antiga paixão que, para sua surpresa, faz amizade com sua mãe.

Esta temporada também conta com participações especiais de Teri Hatcher, de “Desperate Housewivesâ€, no episódio “I Remember the Coatroom, I Just Don´t Remember Youâ€, no qual interpreta a irmã de Judith; Jenna Elfman, de “Dharma & Greggâ€, no episódio “Round One to the Hot Crazy Chickâ€, cuja história continua no episódio seguinte, “That Was Saliva, Alan†e, Chris O´Connell em “An Old Flame With a New Wickâ€.

Duas curiosisades, Heather Locklear, de “Melrose Place†reune-se com Charlie Sheen em “No Sniffing, No Wowingâ€. Os dois estrelaram a sitcom “Spin Cityâ€. Sheen substituiu o ator Michael J. Fox quando ele afastou-se da carreira artistica após anunciar publicamente sofrer do mal de Parkinson.

Já no episódio “Merry Thanksgivingâ€, temos a presença de Denise Richards, ex-Bond Girl, na época esposa de Charlie Sheen. Grávida da primeira filha do casal, a atriz passou o episódio inteiro escondendo a barriga. Atualmente, o casal está separado, vivendo uma batalha judicial em relação às duas filhas e ao próprio divórcio. A briga entre os dois chegou ao ponto de, este ano, Charlie Sheen ir à imprensa pedir ao público que não dê audiência ao Reality Show estrelado pela ex-esposa, no qual ela utilizaria a presença das filhas do casal.

A série foi criada por Lee Arohson e Chuck Lorre. O primeiro está na televisão desde os anos de 1970, tendo escrito roteiros para séries como “Who´s the Boss?â€, “Murphy Brown – A Repórterâ€, “Cybill†e “The Big Bang Theoryâ€, da qual também é produtor. Já Chuck Lorre, está na TV desde os anos de 1980, tendo escrito roteiros para “Roseanneâ€, “Cybillâ€, “Dharma & Gregg†e “The Big Bang Theoryâ€, das quais também foi produtor.

Entre os diretores temos a presença de Andy Ackerman, diretor de “The New Adventures of Old Christine’, “Seinfeld†e “Frasierâ€, entre outras. E ainda, Ted Wass, conhecido no Brasil por interpretar o pai de “Blossom†na sitcom de mesmo nome. Desde o final desta série que Wass afastou-se da carreira de ator para abraçar esta nova profissão, tendo dirigido episódios “Everybody Hates Chrisâ€, “Less Than Perfectâ€, “Til Deathâ€, “The Game†e “Spin Cityâ€, entre outras. (Fernanda Furquim – confira seu blog RevistaTV Séries)