Crítica sobre o filme "Caixa Dois":

Rubens Ewald Filho
Caixa Dois Por Rubens Ewald Filho
| Data: 13/08/2007

Não há duvida que a peça era melhor, mais engraçada. E dá para entender porque o autor Juca de Oliveira ficou tão aborrecido que esta nos letreiros “inspirado†na peça e não “baseadoâ€. Ou seja, mexerem tanto que muitas coisas se perderam ou se diluíram. O resultado, porém não é desastroso. A fita tem problemas: é toda rodada em planos próximos como se já estivesse destinada a televisão (em termos de estética isso é complicado porque enfeia o resultado), custa a engrenar (já que sua trama é complexa e aumentaram os personagens) e a discussão na sala de estar da família resulta longa e menos engraçada do que devia. Mas ainda é um ataque oportuno a corrupção que impera em nosso país (o curioso é que a peça foi escrita já fazem anos, em outro governo e o tema se tornou ainda mais atual, de forma que o filme não tem problemas de acusar “nosso governoâ€).

E, francamente, dei algumas risadas.

Quase todas, graças ao elenco liderado brilhantemente por Fulvio Stefanini, um ótimo ator que o cinema aproveita muito pouco. Como o dono do banco, com jeito de Al Gore, ele tem o tom exato de comédia, sem exageros, sem perder piada. Conseguindo transformar o Corrupto num adorável canalha. Como seu comparsa, não fica atrás Cássio Gabus Mendes, nem Zezé Polessa e Daniel Dantas, como o casal classe média. Só me incomodam algumas coisas que os diretores insistem em não ver: 1) será que os atores cariocas não podiam fazer um esforço e não ficarem sibilando e falando carioquês quando fazem personagens bem paulistanos? Vai ver Bruno que é carioca nem percebeu mas quem comete o crime é Thiago Fragoso e Gioanna ambos com sotaque alheio ao ambiente. Não se vê Zezé e Daniel fazendo nada semelhante porque são experientes e conscientes; 2) Será que ninguém percebeu que Gioavanna e Thiago não combinam? Que ela é velha demais (e não suficientemente boazuda para ser a secretária, papel para Marilyn Monroe jovem! A todo instante fiquei esperando que ela aplicasse um golpe no rapaz.

Como muita gente deve saber, a trama de Caixa Dois é um pouco tortuosa, como alias são as historias de corrupção. Gira em torno de um cheque de 50 milhões que é dado como caução (quem aparece e bem no começo é ZéDú Neves, que trabalha comigo atualmente na montagem de Hamlet Gashô, alias todos os coadjuvantes funcionam perfeitamente). É uma tramóia entre o presidente de um banco fictício (o Federal) e seu assistente que acaba envolvendo como laranja uma secretaria. Só que por erro, o cheque é depositado na conta justamente da mãe do namorado dela, que por sua vez é mulher do gerente de uma agencia do banco e que foi justamente despedido naquele dia. O jeito então é conseguir o estorno, com a conseqüente negociações e discussões sobre o que é honesto e aceitável.

Não sei até que ponto isso vai ficar claro para o publico médio, mas sem duvida eles tiveram um curso intensivo de corrupção assistindo às CPIS e devem ter ficado mais atentos as sutilezas do sistema. Ou seja, sem provocar as gargalhadas do original (teatro e cinema tem linguagens diferentes), Caixa Dois continua a fazer rir e pensar um pouquinho, o que só acontece mesmo nas melhores comédias. Tomara que faça sucesso.
(Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 04 de maio de 2007)