O filme deixa claro que não esta tanto falando do caso em si mas se referindo aos terroristas atuais (isso fica evidente quando se encerra com as imagens da antiga Torres do World Trade Center, vistas de Brrooklyn). O que diz porem é sujeito a varias interpretações. Para o meu gosto, diz menos do que deveria e tambem de forma altamente discutÃvel. Ate como cinema. Muita gente louvou a direção de Spielberg que obviamente é competente. Mas não mais que isso, ate porque o roteiro e mal armado. Ele usa como gancho os fatos de Munich, que são apresentados no começo (como os terroristas árabes se infiltram nos dormitórios e sequestram os atletas israelenses) mas depois retornam em flashes atormentando o herói (que tem visões ou flashs de cenas que nunca testemunhou!). E só bem ao final são mostrados na sua totalidade de massacre (embora não fique bem claro para quem não se lembra mais da cobertura jornalÃstica).
Porque o filme não é exatamente sobre isso mas sobre os fatos que o sucederam, mais exatamente a história de um oficial do Serviço Secreto Israelense, chamado aqui de Avner (o australiano Bana de Hulk e Tróia), que é chamado por superiores que lhe propõe uma missão secreta, ir caçar os terroristas e mata-los, sem julgamento e fora da lei, sem que se possa fazer uma ligação direta com Israel (que negaria sua existência, eles depositam o dinheiro em banco da Suiça e assim por diante). Mas por outro é um segredo de polichinelo (todo mundo sabe o que Avner faz e tem o maior orgulho por isso). O filme embora questione tudo isso em momento nenhum chega a condenar os fatos, no maximo mostra as crises existenciais do herói (que alias não convencem, ele age como amador que tem faniquitos quando descobre que é perseguido tambem quando no fundo seria um matador profissional. É muito mal construÃdo o personagem, já que se ele tivesse esse tipo de crises nem seria escolhido para a missão. E depois que esta nela,demonstra falta de liderança e as vezes mesmo incompetência para levar as façanhas a cabo e algumas so são bem sucedidas pela insistência dos colegas e parceiros do grupo).
O filme me incomoda por tudo isso e por razões mais banais, tais como o fato de ser muito longo (quase três horas) e a gente não conseguir se identificar com o banana do herói (ate porque Bana tem cara de nada), nem com seus colegas (fanáticos demais para meu gosto, embora sejam todos bons atores, inclusive o inglês Daniel Craig que demonstra novamente que é melhor bandido do que sera o novo James Bond. Me impressionaram tambem o irlandês Ciaran Hinds e o diretor francês Kassovitz aqui como ator). Gostei particularmente da escolha de coadjuvantes e dos franceses, porque fazem ótimo uso de grandes figuras locais como Michel Lonsdale (notável como o chefão gourmet que controla as informações do sub-mundo) ou a sedutora assassina holandesa (a canadense Marie Josee).
Enfim, depois dos primeiros crimes só resta acompanhar as mortes seguintes, ou seja tudo vai se tornando repetitivo e de uma forma muito discutÃvel, a gente acaba torcendo por eles, e não pelas vitimas, ou seja, é um absurdo a gente querer que eles matem logo os adversários. Por tudo isso o filme vira amoral e se torna muito superficial (alias caracteristicas de toda a obra de Spielberg). Tenta discutir os fatos uma ou duas vezes (como na conversa entre Bana e o agente palestino, que tenta se colocar e as razões de seu povo). Mas não bota dedos na ferida (embora mostre que o governo de Israel e sua primeira Ministra, Golda Meir tenham realmente assumido a vingança, nome por sinal do livro que inspirou o filme). Mas muita gente reclama e com razão que outros fatores não tenham sido levados em conta. Enfim, acho que analistas polÃticos deveriam se manifestar a respeito mais do que eu, que tambem estou sendo superficial.
A minha suspeita é que ao transformar a situação num thriller de ação, com um herói cheio de melindres, Spielberg não conseguiu o que pretendia, que era pedir a paz e a compreensão no Oriente Médio, com os dois lados fazendo concessões. Melhor dito do que demonstrado.
Indicado como diretor (e não filme) no Globo de Ouro, o filme tem as qualidades habituais de realização e equipe (música de John Williams, foto de Janus Kaminski). Foi tambem o ultimo trabalho de Spielberg para o estúdio que fundou e viu agora ser comprado pela Paramount. Um revés muito forte para uma carreira tão bem sucedida. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 26 de janeiro de 2006)