Crítica sobre o filme "Paradise Now":

Eron Duarte Fagundes
Paradise Now Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 15/05/2006

Foi o vencedor do Globo de Ouro de filme estrangeiro e possivelmente deve ficar na lista do Oscar© da categoria. Também ganhou três prêmios paralelos em Berlim e roteiro do European Film Awards (fora prêmios menores). Mas não sei até que ponto a Academia irá abraçar um filme palestino que conta a história de dois terroristas suicidas, a versão moderna dos kamizazes japoneses. Embora o filme afirme não apoiar a tese deles, tampouco a condena, nem a aprofunda, deixando a impressão dúbia (na verdade, a experiência ensina que ao contar uma história você automaticamente glamuriza a situação , humaniza suas figuras e assim provoca imitações).

O filme de Hany Abu-Assad (palestino nascido em Israel e que tem cinco outros longas em sua carreira) é muito seco, austero e mesmo pobre. Limita-se a acompanhar durante dois dias antes do ataque, dois rapazes palestinos amigos e mecânicos de garagem e que estão dispostos a serem homens-bomba, dois amigos de que se sabe pouco (um deles a gente vê em família e uma moça que encontram). A não ser que são fanáticos religiosos, já que tem certeza que assim que morrerem virão dois anjos os recolherem para levar para o paraíso (daí o titulo que não traduziram).

E mostra-se tudo com frieza, mas também repleto de pequenos detalhes do cotidiano (a câmera que não funciona quando ele grava sua mensagem e assim tem que repetir. O líder do grupo que parece um burocrata). A maior critica a ação da dupla vem uma mulher Suha que estava começando um namoro com um deles. Ela nasceu na França e tem certo status porque é filha de um antigo líder. Mas ela não aprova o suicídio, até porque acha que as regras islâmicas proíbem o suicídio (e se alguém se mata não se qualifica como mártir, portanto não iria para o paraíso como eles querem). E também acha que os efeitos das bombas é criar vitimas inocentes e inspirar um ciclo de violência interminável.

Mas não senti que o filme tenha conseguido discutir a situação. Descreve a ação de dois candidatos a terrorista, deixando muita coisa no ar, tudo justificado em nome da religião. Alguns sentiram no filme um clima de suspense, de thriller que não chegou a me afetar. Mas sem duvida sentimos a paranóia em que vive todos na região (Por Rubens Ewald Fiho na coluna Clássicos de 26 de janeiro de 2006)

Hany Abu-Assad é um diretor de cinema palestino cujo local de nascimento é a polêmica nação de Israel e cuja residência é a Holanda. A formação humana e cinematográfica de Abu-Assad é, pois, marcada fortemente pelos conflitos extremamente sanguinários entre árabes e judeus na geografia de Israel e pelas características itinerantes e apátridas do povo a que o indivíduo Assad pertence. Esta radicalidade de vivência se reflete na forma cinematográfica exposta ao longo da narrativa de Paradise now (2005); em todos os momentos do filme a secura documental do plano cinematográfico e o rigor de uma concepção política do cinema se refletem nesta desconsolada ausência de concessões que um distante espírito palestino pode produzir na tela.

Abu-Assad situa-se, esteticamente, no lado oposto daquele cinema de massa e imponente do norte-americano Steven Spielberg em Munique, onde igualmente as exasperações entre árabes e judeus na Palestina são objeto da câmara cinematográfica a partir que houve nas Olimpíadas de Munique em 1972. Abu-Assad vai tratar em seu filme da figura do homem-bomba palestino; Assad é suficientemente hábil para humanizar um ser que aos olhos ocidentais se aproximaria dum monstro, e é de se louvar a naturalidade com que o cineasta põe ao lado das coisas do cotidiano esta situação de exceção, um homem que em nome duma causa vai explodir-se ao mesmo tempo em que explode seus inimigos.

Há pelo menos um momento em Paradise now em que o filme se converte num puro documentário. Said está a bordo dum carro pelas ruas; a câmara, como captando o olhar verdadeiro da personagem, olha para fora, é como se o diretor deixasse de construir sua ficção e enxertasse ali cenas documentais de pessoas em atividades normais, sem liames dramáticos.

Curiosamente, num filme sobre tensão e explosão, a explosão não está em cena. Abu-Assad despojou seu filme de violência. O que torna esteticamente seu filme mais violento do que os tons explícitos de Munique.

Pode-se reprovar a Abu-Assad certos maneirismos que impedem sua linguagem cinematográfica de atingir uma plenitude mais profunda. Mas Paradise now é, bem mais que Munique e suas teias de hipocrisia que a habilidade de Spielberg oculta, uma “oração pela pazâ€. (Eron Fagundes na coluna Cinemania)