Crítica sobre o filme "Accattone - Desajuste Social":

Eron Duarte Fagundes
Accattone - Desajuste Social Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 08/12/2004
O italiano Pier Paolo Pasolini sempre foi um cineasta extremamente árido. Suas atividades de escritor (romancista e poeta) o encaminharam para um modo duro de filmar que afastava muita gente sob a desculpa de que se tratava mais de um artista da palavra que da imagem: tinham-no como indigesto como realizador. Na verdade, ele foi um dos grandes nomes do cinema italiano: nunca fez concessões comerciais.

Seu filme de estréia, Accatone (1961), é uma boa amostra de suas inquietações temáticas e formais. Não é ainda seu nível mais apurado (que começaria a desenhar-se na obra seguinte, Mamma Roma, 1962), mas ali topamos a naturalidade ou mesmo uma interessante boçalidade com que ele filma os tipos vadios das cidades italianas nos anos 60: o vagabundo interpretado por seu habitual ator Franco Citti e a ingênua que o vagabundo transforma em prostituta são as criaturas centrais em torno das quais circulam outros vagabundos e outras meretrizes. A maneira com que Pasolini se aproxima destas vidas sem perspectivas difere daquela de Federico Fellini em Os boas vidas (1953): tudo é menos lírico e mais violento (o título do romance de Pasolini que deu origem ao filme é Uma vida violenta).

Accatone tem lá seus momentos arrastados e frouxos, frutos da inexperiência do diretor estreante; mas é uma curiosa introdução ao cinema do autor de um dos mais ferozes filmes da história, Salò, ou os 120 dias de Sodoma (1975). Como curiosidade histórica, Bernardo Bertolucci, cujo cinema é bastante diverso do de Pasolini, foi assistente de direção em Accatone. (Eron Fagundes)