Não há dúvida que é uma história importante, já que pela primeira vez temos detalhes dos últimos dias de Hitler e do Nazismo, porque Trauld estava no Bunker e foi testemunha de tudo. Por outro lado, é visível que ela faz tudo para não se comprometer, dizendo que era ingênua e confusa (o que soa altamente inconvincente) e provavelmente inventando detalhes que “não lhe sujassem as mãos”. Além disso, temos que acreditar piamente no que ela conta, já que não há outras testemunhas (embora nos pontos básicos ela não fuja do que sempre se contou). Também faz pensar na incompetência dos pesquisadores que levaram 50 anos para encontrá-la (e pouco antes de sua morte em 2002).
O lado ruim do projeto também é que ele foi entregue às mãos de um diretor altamente incompetente, que não sabe escolher ou dirigir atores (alguns deles estão péssimos, a maioria compromete e somente o veterano Bruno Ganz, como Hitler, é que faz o papel com certa dignidade, ainda que não brilho, sem cair em caricaturas). Não sabe criar clima, tensão ou emoção.Faz um filme feio, com estética de telemovie de televisão européia. O mais estranho é que antes ele tinha feito uma fita interessante chamado O Experimento! De qualquer forma, o filme é decepcionante como cinema (até mesmo como narrativa, já que prossegue por quase meia hora depois da morte de Hitler, mas nem sempre se preocupando em mostrar apenas o que a secretaria viu e ouviu). Mas muito curioso como reprodução da história.
Não há qualquer lógica em boatos de que daria uma visão humana de Hitler, portanto amenizando seus crimes. Ao contrário, ele é mostrado como um velho de cinqüenta e poucos anos decadente, sofrendo de Mal de Parkinson, dado a ataques histéricos, completamente cruel e sem piedade (dizendo que o povo alemão deveria pagar por ter perdido a guerra), tendo delírios e sendo incapaz de enfrentar os fatos e a derrota. E principalmente insistindo em se matar e mandar todos os seus auxiliares próximos fazerem o mesmo, sob pena de serem considerados traidores. Basicamente o filme é um estudo sobre o fanatismo, principalmente na figura da Sra. Goebbels (feita por uma péssima atriz) que mata friamente todos seus filhos, mas tem um ataque histérico pedindo para o ditador fugir. Fanatismo que ser reflete nos cidadãos que estavam na rua matando a esmo os que consideravam traidores e desertores, mesmo quando o exército russo está a poucos metros da cidade. Em muitos oficiais que preferem morrer porque fizeram um juramento de obedecer a Hitler. E uma das frases mais fortes do filme, além do orgulho de Hitler em ter matado tantos judeus, é o fato de que os nazistas chegaram ao poder através de eleições, de meios legítimos e não através de um golpe de estado. Ou seja, já que o povo alemão escolheu esse tipo de governo, agora teria que pagar por isso.A figura de Hitler que vemos é um sujeito patético, louco (mas não histérico), iludido e amado fanaticamente por seus asseclas, que aceitam tudo sem discussão ou questionamento: talvez seja isso que mais impressione, ninguém ousa questioná-lo, enfrentá-lo, desmascará-lo. É uma ilusão coletiva que nos deixa pensando em outros fanatismos atuais, seja em seitas religiosas à la Jim Jones, ou no caso dos mulçumanos fundamentalistas. Como o ser humano é frágil e pode cair em situações como essa. E com freqüência assustadora.
A Queda é medíocre como cinema, mas notável como imprescindível lição de história (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos em 10 de maio de 2005)